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As tranças do Brasil
As tranças do campo nas ruas são tranças que surgem em recortes, que ardem, incendeiam, pensionistas da Aracruz! E descobrem que as tranças procriam, riem, sacodem, e as tranças serão pagode ou novelas da TV As tranças chamadas Leonídias, são Juras, eleitas, as tranças do campo, perfeitas!, vão chamar de Sangue Bom: doarão órgãos, medirão seus ossos e as tranças desfilarão magrelas as remelas de um batom As tranças ganharão crianças, as tranças abrirão poupança, as tranças de tão mexicanas anúncio para a chuva molhar As tranças no campo das idéias. As tranças virarão matérias, tranças-chapinhas, tranças em evolução As tranças formigas, as tranças da Universal! Tranças e tranças no processo industrial: tranças por cento, tranças ao quilo, as tranças serão pós-modernas, as tranças, baderna, as tranças no cordão. As tranças do Pelourinho. As tranças da Paraíba. As tranças pó-de-arroz ou centeio, as tranças partidas ao meio lembrarão minha avó. As tranças do hip do hop, as tranças que mostrarão chicotes nas casas de diversão As tranças como prova, as tranças pro DNA. E as tranças subirão o morro, as tranças pedirão socorro, não mais tranças, destrançar... Já então tranças dos Campos Poesia Concreta as tranças serão oferta nas saídas do metrô E do Itaim ao Congresso farão sucesso as tranças estendidas na rede lá nos braços do Bial! pr
Salva de palmas
conheceu o rosto dele? não conheceu! poucos o conheceram, eu sei... o rosto dele era assim: um bom coração, pai fugitivo por que ainda um pai morto? por que o estender de mãos se dizias Não gosto dele? por que essa salva de palmas no encontro que não houve?? pr
Pauzinho
A primeira coisa que fizeram na vez do acidente na serraria foi salvar o Pauzinho. O Pauzinho era o homem que tinha caído na serra-fita e ficado sem as duas pernas. O Pauzinho ficou sem as duas pernas e inconformado. A Assistente Social disse que ia mostrar ele pro outro doutor. E deram uma abração no Pauzinho antes de sair do quarto dele. Abraçaram ele depois que a tia dele foi lá e contou tudo; já fazia 45 dias. Tombado na cadeira, fechava os olhos e aquela vida estendida. Ele não se queixava. Só um dia o Pauzinho protestou. Mas foi só porque tava muito escuro pra ele descer a escadinha do corredor das prateleiras de sabão. De-bundinha daquele jeito, no corredor com a luz queimada. Ele caminhava com as mãos olhando pra trás porque vinha luz lá do alto do outro andar. O Pauzinho que era bem pequeno, ainda mais no escuro. Sempre lavando o rosto com bastante espuma. O suor do despernado daquele jeito e a barriga com dois caroções. Quando andava bem de saúde ele só voltava pro porãozinho onde morava só de noite. E ele tinha sono e não dormia. Garrafinha de mentruz pra dor nos ombros. Gostava de uva. E tinha uma gavetinha cheia de sutiãs. Um guarda-chuva. Mas era preciso chover muito pra ele sair de guarda-chuva. Ninguém conseguia entender como o Pauzinho não se desesperava. Trecho de Valsa dos Aparados, ps. 18 e 21
A desconfiança é uma droga
Se há uma coisa que me estraga o dia é a desconfiança. É dizerem coisas que não fiz. É afirmarem situações que, estou afirmando, não presenciei. Nunca te estragaram o dia assim, leitor? Criarem situações fantasiosas e atribuírem a estória a você? Atribuírem ponderações jamais feitas, você ter certeza que não disse, e a pessoa insistir que ouviu ou leu. Isto me estraga, porque a desconfiança é o que mais se aproxima de se perder a razão. Porque a desconfiança irrita, tira a calma, você logo passa ao vozeirão. “Não fui eu, estou dizendo!” Mas, o desconfiado, na sua convicção de dúvida, insiste que sim. É um dano isso. Dano moral. Ataca os princípios, duvida de nossa formação. Em situações assim, é pensar: bem, até provem o contrário, estou sendo honesto comigo. Em seguida, oferecer logo a face e deixar, fazer o quê? Quem se arma de desconfiança, na desconfiança vai continuar. É uma teimosia desvirtuada: se digo que não fiz, não fiz. Se digo que não fui, não fui. Mas não. Nem o olho no olho vai convencer. Quer ser o dono da verdade, porque a vaidade do desconfiado reside na dúvida, sim. É o seu charme. Quando digo que é isso, porque retrucarem com o aquilo? Ora, se estou dando a palavra, por que atalhar??? Nada de atalhos. Eu gosto é de estrada sem curvas, a minha vista sem turva, pensamentos bons. Por isso, o que me estraga o dia é a fina ironia do duvidar. O riso do será?, fale a verdade, isso é provocação. E na hora reajo, na hora rebato, mas logo desanimo e o próximo movimento é o de me distanciar. Não quero mais, fique com isso!, não entre nessa de me julgar. Quando falho, eu assumo, eu confesso, eu não minto. Mas, o que me deixa mesmo danado é saber que dizem o que eu não fiz. É sacanagem, é uma incredibilidade a te nocautear. No amor, por exemplo. “Não liguei, me acredite!” Mas, vá convencer! A tua ouvinte está ali e não arreda. Duvida por escolha dela, só ouve o que quer, se ouvir... Se há coisa que não aceito é isso: duvidarem dos meus propósitos. Não admita também, leitor!
Jornalista ou escritor?
A Claudete Travi é nossa aluna na UCS e está fazendo uma matéria para a disciplina da Biba, sobre a relação entre o Jornalismo e Literatura. Olha aí as respostas, Claudete, na corrida. 1- Você acha que o currículo de jornalismo privilegia a escrita/produção textual? Acho que não. O curso é essencialmente técnico, privilegia muito o “laboratório” e tem pouca teoria e exigência de leitura que, ao fim, é o que forma não só um ótimo profissional, mas aperfeiçoa o cidadão. E a imprensa precisa destes dois cada vez mais. 2- Você acha que a modalidade de jornalismo narrativo (imersão do repórter na realidade/humanização) vem sendo praticada no jornalismo de hoje? Por quê? Infelizmente, muito pouco. As revistas semanais ainda tentam algo próximo. Mas experiências como a revista Realidade, que é o ideal e jornalismo correto, estamos longe de ter. Mas, isso não quer dizer desistência, devemos lutar sim por essa "utopia", no sentido da utopia como o ideal, o jornalismo que enaltece as qualidades do homem e denúncia as suas fraquezas. 3- Você acha que os leitores de jornal/revista têm vontade de encontrar este tipo de jornalismo (Jornalismo Narrativo) no dia-a-dia? Sem dúvida. Há uma enorme carência, uma demanda reprimida por reportagens humanizatórias, de conteúdo, que tragam um texto próximo da literatura. Isto é, uma reportagem que, além do conteúdo, fisgue o leitor pelo estilo e por idéias bem estruturadas. 4- Caio Fernando Abreu dizia que odiava tudo que escreveu em jornais e revistas, mas tinha que fazê-lo para sobreviver. Dizia, também, que no Brasil há escritores de finais de semana e feriados. Como você se sente exercendo paralelamente a profissão de jornalista com a de escritor? Não acompanhei tanto a fase de jornalista de Caio, não posso opinar. Mas se ele fez a sua crítica, ninguém melhor do que ele para avaliar. Eu tenho no jornalismo hoje o meu ganha-pão em sala-de-aula. E colaboro no Pioneiro. Colaboração que me serve de estímulo, como um espanta preguiça para escrever. Mas não me influência em nada, não. 5- A convivência das duas funções beneficia ou prejudica alguma delas ou quem as exerce?Prejudica muito para quem está imerso na ficção, sim, porque dispersa, interrompe o fluxo do texto. Ajuda, como tudo ajuda, porque a partir do jornalismo, que é uma experiência da realidade, do factual, você pode depois se expressar melhor na ficção. 6- Você acha que o jornalismo pode "fazer" escritores? Sabendo que Machado de Assis foi escritor nas redações de jornal, Gabriel Garcia Marquez foi Prêmio Nobel de Literatura? Pode fazer escritores, como temos vários exemplos: Tom Wolfe, Gabriel Garcia Marquez, Euclides da Cunha, etc, etc... Mas há alguns que fugiram do jornalismo, exatamente pra poderem escrever. Hemingway é o caso mais notável. Ruy Castro, o mais próximo. 7- Quem deve mais a quem, o jornalismo ou a literatura? Não, não é uma relação de compra e venda. É uma relação de mútua troca. Mas, de novo, Hemingway. Você deve ser esperto o suficiente para saber quando nesta relação de troca você começa a perder. Aí, deve cair fora. De um, ou de outro. É questão de escolha.
Pedaços de Glaucha
Eu olho para mim mesma e sinto dançar na minha alma uma mulher de longos cabelos que não deixa ver sua cabeça. Uma mulher que olha os meus olhos, mas que não deixa eu olhar a sua boca. O meu gesto, a minha palavra usada: muda. A altura de minha mão esquerda. Minhas dimensões são alongadas de um lado para o outro. Só aquela voz. E um homem destes inteligentes me olha dentro do meu sonho e me estende uma toalha. Enxugo o meu rosto e lhe devolvo o meu próprio sudário, com as marcas de meu coração de fêmea. Tudo dança. Não vejo o tempo. Não vejo como as pessoas se dispersaram do meu sonho. Elas se dispersaram, porque se dispersaram quando acordei. Eu já não as vejo. Eu sei somente nomes: um dia começa a nascer. Elas e parecem muito com este novo dia. A boca do novo dia, com suas bocas. O prazer de bater nesta luz do sol é o meu prazer, ao mesmo tempo que o ar tomba as grandes folhas das árvores, o seu prazer. É o seu tempo de prazer. Eu me agacho, eu procuro a minha outra maneira de ser como a folha desajeitada no novo chão. Outra maneira única. Eu sou como uma ruazinha sem pedestres onde um idoso estende sua tenda de pães. Trechos de Glaucha, ps.139, 140
O enrola-enrola da amarradinha
A linha de apoio da mãe é o filho. A linha da aparência os dentes são. A linha que apóia a verdade é a linha do olho. A linha da mulher sozinha é o solteirão. A linha que apóia a doença é a presença constante, a linha do ressentimento é o não fazer. A linha da briga é a capoeira, a linha da gíria é o rap, o estilo do repetir. A linha do calmo engole-em-seco, a linha que apóia a língua é o texto, o seu alinhar. A Linha dos Nove não é ninguém, não é Dez, não é nada. A linha de apoio do vaidoso é o invejar. Do fracasso, é o grito; o feijão com arroz. A linha comum é o quase, o nunca, a linha do bem capaz! Mas a linha que apóia pede lupa, como a jaula pede o leão. A linha da sopa não é o caldo? Quem alinha com prece não apóia Deus? A linha que hoje mais cresce é a linha do desmedir. A linha da tropa, a asneira de um Bush, a linha que estende o espinho ao invés da flor. Trecho da crônica da semana, que pode ser lida na íntegra clicando acima
O sonho de Luzília
A Luzília ficou uns cinco anos seguidos se engravidando. Tava louca pra sempre se ficasse assim se engravidando. Mas até umas bonecas de pano já eram parte da gravidez que ela tinha. E a Luzília aprendia com cada gravidez e ficava bem igualzinho. E continuava se engravidando e era o jeito que procurava de ganhar um filho. Com amor, tudo rosa e carinho, a Luzília tinha feito um enxoval com a imitação de asa. Com amor, tudo azul e carinho, a Luzília tinha feito um enxoval com a imitação de anjo. Pro tiro não sair errado, a Luzília tinha já preparado até enxovalzinho pra gêmeos. Era um jogo de qüero e fraldas e a Luzília, se descuidassem, levava ainda mais a sério a chegada do seu primeiro. E levava. Vivia olhando o peso. E de tanto se ver nas nuvens, a mulher que não engravida, engravida por si mesma. E fica com umas formas rosadas, e fica a pele melhorada e muito excedida no sal. Por isso que a Luzília sentia muita sede e bebia tanta água que não conseguia mais entender. E da primeira vez que se fez de grávida a Luzília se urinava de contente. E nem é assim quando se está. pr
A mãe, a filha e a barca
A barca traz o corpo morto. A água do rio refrata a mulher de joelhos. Uma mãe, pendurada e viva no caixão da filha morta. Em seu desespero, com as pernas entrançadas, a mulher vem dependurada no tampo. Seu corpo pesa. Embalado. É mãe com seu grito tétrico de horror e apego. Ai que dor! Ai que dor de Deus! Navega o caixão grande na água. Para isso se faz o Barreiro agora. Uma paisagem. Na cortina de sua água a sombra de uma cruz de pau. Mãe e filha descem de costas o rio. A força de mãe no tampo, a força das mãos para arrancar a janelinha do caixão. Ai dor dependurada. Ai dor de mãe querida! Uma forma de bicho essa mulher em seu amor. E a barca vem também ela como um grande defunto deslizando. Resvalando neste rio. O rio, calmo, de posse deste caixão e do grito materno. A cortina de água se crispa. Dependurada no tampo segue a mãe e um repicar de sino distante. Dolorosa espécie de missa essa volta. pr
O Baile de Gala e o Rosário dos Povos
Não fui eu que peguei o casaco, a negra dizia. Toda a gente da Valdomira tava ali num devo terço, num por Deus, Nosso Senhor! O delegado que acreditasse, ela não tinha o casaco de pele, nem dela, nem o da outra, era uma infâmia de ofender. Não roubou. Mas, a Valdomira, cozinheira do Baile de Gala, ia se explicar depois. Por hora, ia puxar uma cana, ficar na Sala Afastada, a cela pra gente formada ou delito como o seu. E se entregam os negros então à prece, conta por conta, além da Sala, uma prece universal. Na 1ª dezena de seus rosários rezaram pela África. Na 2ª dezena rezaram pelas Américas. Na 3ª pela Europa. Na 4ª, Oceania. Na 5ª pela Rússia Comunista. E o que sobrou da triste reza era um clamor que perdura aí. A cena do Baile de Gala é cena real, nos anos 60, no meu Bom Jesus. pr
Tecido Social
A roupa do Clube era roupa caseira. Era roupa de domingo, roupa de rico, era roupa de mão cheia feita mesmo à mão. A roupa do Clube era boa, roupa de polaco, ferreiro, era roupa de maçom. A roupa do Clube era engomada, roupa pra usar de fora, roupa passada, roupa para aquela ocasião. Roupa arejada, de negociantes, sírios, solteiros, a roupa do Clube não sabia a discrição. Roupa pra nenhum José, coveiro, coitado, a roupa do Clube era ligada ao couro, ao dinheiro, roupa de fazendeirão. Roupa com ar de graça, desculpa, obrigado!, roupa-trapaça, era roupa do melhor. A roupa do Clube já era de linho, brim, casemira, nunca napa, a roupa que foi de Hortêncio, Nardinho, de um Acácio, quando havia Bom Jesus. pr
O instante perdura
Sobrei aqui, amor, e sorvo ainda tua erva, teu chima Ainda aqui uns teus cabelos Ainda a toalha úmida no estendedor... Acaricio o que ficou do teu propósito: um teu instante de joelhos ainda o teu cheiro na casa e no peito. Acaricio coisas não esquecidas... porque bem pensadas por ti! pr
Espreita
Corpo paisagem silêncio Seios descalços inteiros Amigos estratégias conselhos e um macho que espreita o casar contigo pr
A dignidade de um amor
De um grande amor não sobram incertezas e deste não sobrou. Foi forte a tua decisão, mulher sofrida! A tua retomada em busca de uma antiga felicidade eu soube entender. Embora a dor, compreendi. Embora a dor, aceitei. É a prova de um sentimento disposto a não abrir feridas e a rezar por ti. Eu tenho a tua certeza agora em mim. Meus lábios já aceitam a nova palavra e eu a pronuncio: compreensão! Por isso, sem mais discussão, diálogo, lágrima, eu me vejo agora herdeiro de um amor que restou tranqüilo. Talher de um jantar só? Talvez. Mas, me parece mais um coração quebrado a aceitar. Sem drogas, sem álcool, sem rock’roll. Daí que, feito o balanço do estrompaço, eu já posso dar um nome ao que nos aconteceu: dignidade!!! pr
O coração do Rozeno
Esse enfartado é o coração do Rozeno. Esponja grande, o Rozeno tinha o coração pra dentro, disseram, quando morreu. A dor, o dia que a dor lhe veio, lhe deixou esfaqueado. Bem esfaqueado ficou de olho aberto o Rozeno. Bonatto com a doçura que tinha de gente do interior. Fervia de quente o coração do Seu Rozeno. Seu grande coração decerto queimava no enfarte dele. O susto foi um só. Soubera já mortalmente do seu coração pifando. Dói a cabeça. A cabeça dó de aviso. Para alguém sozinho como o Rozeno, tragam água nesta hora. E diz-se que tava sozinho. Quê se abraçou com força. Decerto pra não morrer. Que seu peito ardia. Que acharam o homem pesado de olhão aberto. Ar de criança triste já sem tremor. De cabeça pendente. Morto. Sozinho. Trecho de Valsa dos Aparados, contos, p. 121.
Uma grande mulher
É um gesto singelo, mas é pra ti. Paulo
As minhas tias gêmeas
As minhas tias gêmeas estavam me chamando As minhas tias gêmeas diziam, não demore As minhas tias gêmeas do Tio Tonho e Sebastião
As minhas tias gêmeas sempre as duas As minhas tias gêmeas, arrume as coisas!! me chamavam de Paulinho
As minhas tias gêmeas de esmalte As minhas tias gêmeas: nos obedeça! nos obedeça!, e duas vezes eu retrucava, mas nem à mãe! pr
A solidão
No meu balcão de despachos eu tenho de estar altivo alegre, alinhado, um homem à disposição Mas sei lá de que pântano, lama coisa infame, a solidão volta, ingressa, atrapalha e impera, já atravessa toda a minha vida e não sei deixa pegar pr
O último beijo
O último beijo foi bom e forte, deu muito mais do que tinha a dar. O último beijo, como uma prece, suplicava o milagre, a cura, o enriquecimento súbito que a distância traz. O último beijo queimou, ardeu, antecipou a saudade e foi um beijo pra durar. Ele dava afago, conselho, uma noite inteirinha pra pensar. Beijo para durar porque era o último. Era o último. E um último bem piegas, com lágrimas, era um beijo de frouxar as pernas, bem coisa de mulher! Nunca beijaram assim e deviam. Deviam ter-se beijado mais pela última vez, porque no último beijo se desmaia e uma desmaiou. E sem vergonha, porque o último beijo foi bom, da hora, foi fatal. Ele botou porta adentro um coração em fogo, coração precisando de água, beijo último, derradeiro, conclusão, ponto e fim: fez da mulher, guria. Fez da madura, ingênua, menina, criança, um beiço só! O último beijo é pra sentir e esta trocou de ponta. Porque o último explode, estica, suga e sorve, é beijo com alta pressão. Um último beijo acaba com tática, quem já não viu??? No último beijo ela ficou com os braços da filha em torno. Sentiu o corpo inteiro e suado, chorou na hora e reclamou: “ter filha pra quê?” pr
Dick
De tantas gravuras que tenho, esta é a que menos gosto. Eu devia ter rasgado. Ela surgiu assim e não há muito a dizer: há flor espinho em desarmonia. Vê-se um menino e a máscara de gibi. Ao fundo, as coxonas (e sempre um seio!), seguramente, de minha mãe. E o cachorro: esse é Dick. Único animal que amei. Eu tinha, 3, 4 anos. E nunca o esqueci! pr
A rainha feia
O pai fabricava manteiga e ela operava com ele a máquina. Os cabelos da moça eram os cabelos da mãe, cabelos fortes. Era uma moça querida, sabia tocar piano. Tinha conforto em casa, prataria e louça. Era tímida. Os olhinhos duas pedras. Sentia um vazio... Tinha a cintura fina, a aptidão de ginasta. Jamais se atrevera à dança. E, se fosse rainha, seria rainha feia. A rainha mais feia aquela pessoa bonita. pr
Seu Querido e D. Tuca
O Seu Querido, Emílio Breyer, tinha flâmulas só de cavalos, tinha fundado o Aeroclube e arranjado sino, casamento, um potreiro pra igreja. Era muito comunitário e sempre queria saber do tempo por causa dos aterros. A pasta do Seu Querido tinha a cor do guará e continha os seus instrumentos de engenheiro. O Seu Querido tinha os olhos esgazeados verdes, e com esses olhos de Cristo tratava de melhorar o cabelo. E os cabelos era um espicho, tingidos, e o Seu Querido sempre de suspensórios. Os sapatos escovados, brilhosos, e as calças, sem pregas, num vermelho afogueado que lembrava um antigo incêndio.
Seu Querido e D. Tuca II
A cena que se quer falar se passa com o Seu Querido tirando a sua sesta depois do almoço e estão no sombreado do cipreste largo, num doce abrigo de amigos. O Seu Querido está dorminhocando com o braço torcido no colo da amada. O Seu Querido tinha bebido à saúde dela e como tinha no cálice a marca dos lábios de D. Tuca, ele tomou várias vezes. Beijava assim os lábios da D. Tuca e também se embriagava. O Seu Querido era muito carinhoso e sabia por a mão assim na D. Tuca dele com calma. Pousava a mão no joelho da Tuca amada e isso facilitava para que os dois rezassem por eles, pelo amor deles. E a pontinha da saia da D. Tuca se esgarçava assim subindo na perna dos seus 76 anos. pr
Presente
Primeiro os corpos caídos, a dor imprevista, o instante roubado depois foi do mundo o melhor: o top esquecido e a mancha do batom por mimo seu pr
Troca-troca de brinquedos na licença para a visita
Em legítima defesa Julia Maria arrancou a perna de seu pai pr
Despedida do sol
A perna que se arrasta neste acamar tão público embarriga do sol e o estocar é sutil, de quem parte pr
Distância
Um barco, um bonde, um ônibus, um tênis. Vá prum avião que te carregue!!! Mas, vê se reaparece, mulher! pr
O rosto do corpo
O rosto do corpo se arrodeava fazendo o outro corpo arrodear junto. A pena que dava do corpinho sem janela, pois lá dentro não ventava. E as crianças então gritavam, “olhe o rosto do corpo. Ele não usa sapatos”. O rosto do corpo andava de pés descalços e teria uma múltipla capacidade se a criança pensasse o depois. Mas criança não pensa. pr
Malha para mulher assustada
Malha malha malha deve malhar a mulher assustada assustada com o peso assustada com a idade assustada por um segundo amor pr
Com as duas mochilas e contrariada
Com as duas mochilas, o coração espremido, faz carão, chuta o trajeto e segue enforcada por estas alças contorcidas. E as duas mochilas, duas grandes asas, formaram então o que se tem dos pássaros em meio às correntes. Sabemos, é um vôo ainda macio, sempre um vôo, apesar do vento. Ali, a maciez era a da pureza contrariada. pr
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