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terça-feira, novembro 25

Respiração assistida

O António Lobo Antunes é injustiçado por esta boa vontade com o Saramago, pois ele é muito mais escritor, mas eu quero falar é de outra coisa. A literatura dos portugueses é muito interessante e por isso eu ando atrás dos livros editados depois da morte de Fernando Assis Pacheco, que morreu deixando uma obra incompleta e a ser publicada.
Fernando Assis Pacheco (que como Lobo Antunes andou em Angola, na Guerra Colonial) foi das pessoas mais solidárias que conheci. Se há coisa que não entendo é por que pessoas de bom coração sofrem, e este é um dos mistérios da nossa passagem aqui. Lá no Beco do Seu Palmírio, em Bom Jesus, D. Odila marcaria a minha infância pela sua solidariedade.
Éramos uns 50 vizinhos, sem queixas, com uns jardinzinhos com rosas, e nem havia luz, era vela. E havia a água no poço de D. Odila que, como em Cuba, matava a nossa sede sem cobrar.
Eu pedia flauta no meu aniversário, um besouro era tanque de guerra e um astronauta improvisado na latinha do fermento Royal. D. Odila ficou cega nesse tempo aí.
Dá pra escrever ajustadinho, sem força, depois disso? Depois desse universo do Zaino! Tordilho!, rayovac-cavalos — desses improvisos da infância e da privação?? Não. Acabamos sendo a marca de onde viemos e por onde andamos.
Corto para Lisboa, no ano da graça de 1985. Depois de malograr uma temporada de estudos, fiquei sem eira-nem-beira lá. E Fernando Assis Pacheco, que me conhecera de pouco, não se fez de rogado em ajudar. Chegou a fazer uma lista aos amigos para comprar a passagem de minha volta. Foi ele quem levantou a grana.
Depois, perdemos o contato, e soube apenas de sua morte em 1995, de infarto. E o professor Abel Barros Baptista (um dos nossos professores na Universidade de Lisboa) organizou o seu livro de poemas Respiração assistida. Fernando, que foi mandado para Angola nos anos 60, fala neste livro da poesia num alcance literal: como um testemunho de quem assistiu mortes na guerra. E também como ato poético. Respiração assistida é o ato vital do poeta, o expressar que recebe a audiência do leitor. Por isso, “assistida”, na melhor definição.
Thaís Baldasso, que faz um documentário sobre a Literatura de Caxias, outro dia indagou por que escrevo. Respondi que é “pra salvar a pele”. E quem já bebeu do poço (ou quem sabe onde é Luanda) entenderá.
Texto para o Pioneiro de amanhã. Aliás, mudou o e-mail. Agora ficou mais fácil: paulo.ribeiro@pioneiro.com

quarta-feira, novembro 19

Segunda divisão

Tarquínio Zambelli chegou em Caxias em 1883. Diplomado pela Escola de Belas Artes de Milão, obviamente, encontrou aqui uma acanhada vida cultural na colônia recém fundada. Zambelli virou santeiro, foi ganhar a vida com estátuas e esculturas destinadas a igrejas. É dele, por exemplo, a imagem de N. S. do Rosário da Igreja das Dores em Porto Alegre, e um Divino Espírito Santo da catedral de Caxias.
Em 1900, faz a representação do que encontrara aqui. Numa peça de grande dimensão, aparece a vila, casa, bodega, animais, a pequena rua. E ainda uma lavoura, espigas, um menino que segura uma enxada, a nascente agricultura. Com este trabalho conquista a medalha de ouro na Exposição Estadual de 1901, em Porto Alegre — então o maior espaço para os produtos do Rio Grande, e com uma seção para as artes.
Seus filhos também seguiriam na arte sacra e com um ateliê que fez história. Michelangelo, o filho do meio (autor da imagem do Senhor Morto na Igreja do Santo Sepulcro; que nunca fui conferir, minha fonte é o Athos Damasceno) casaria com uma filha de Pedro Stangherlin.
Acontece que Stangherlin era o grande concorrente de Tarquínio. O conhecimento da arte que dava autoridade a Tarquínio, contrastava com Stangherlin que chegou aqui antes, em 1876, entre as primeiras levas de imigrantes.
Autodidata, Stangherlin trabalhava a escultura em madeira. Fez uma N. S. do Carmo, que pertence à catedral de Caxias, e a imagem de N. S. do Caravaggio, lá no Santuário em Farroupilha.
Tarquínio tinha escola. Stangherlin, talento espontâneo. Por isso, talvez, Stangherlin jamais se conformou com o segundo lugar naquela exposição de 1901, perdendo para Zambelli. Dedicou 11 meses de trabalho também na representação de Caxias, uma jovem colona em trajes típicos, trazendo a bandeira brasileira e nos cabelos uns cachos de uva.
Irritado com a decisão do júri, Stangherlin determinou o imediato recolhimento da sua escultura e a devolução para casa. Na volta (lancha até o Caí e carreta até Caxias), estragaram a estátua. Apesar de várias propostas de compra, sequer retiraria a peça de um caixote. Ficou guardada durante 11 anos até a sua morte, em 1912.
Aquele inconformado Stangherlin, por certo, refutaria este “espírito segunda divisão” que tomou Caxias em 2008, seja em música, teatro, literatura, na visão de mundo, enfim.

(Texto publicado hoje no Pioneiro. Acima, Estátua de Jesus, de Michelangelo Zambelli).

terça-feira, novembro 11

Foi Deus nada acontecer

O médico baiano Thales de Azevedo, que acabou se tornando historiador e antropólogo pelo andar da vida, foi o primeiro a pesquisar com afinco a imigração em nosso meio e a registrar a aculturação dos italianos já nos anos 50. Este Thales era um cara interessante. Além de também pintar, era fotógrafo, e já se preocupava com a qualidade das lentes, pois queria sempre flagrar as coisas no que elas tinham de mais “miúdo”.
Thales era casado com Mariá, uma pianista de Livramento, e daí se explica porque andou aqui entre os gaúchos. Em casa, tinha uma mania. Todos já sabiam que os jornais deviam ficar intocados, não poderiam ser manuseados, pois aquele era o único motivo que tirava o generoso médico do sério. Dizia que jornal revirado parecia com notícia requentada, e ele queria ler as notícias “fresquinhas”.
Pensei em Thales agora na estréia do Pioneiro virtual. O Pioneiro na Internet é a promessa de termos, de “minuto a minuto”, perdoem a redundância, “as notícias novas”. E fiquei também pensando se o Pioneiro conseguirá manter com novos acontecimentos e episódios a sua página na Internet.
Já teríamos vida cultural e econômica tão ativa, relações sociais tão dinâmicas capazes de alimentar um site que exige notícias sempre atualizadas?
Bem, a resposta eu tive na segunda, e não precisava este exagero na resposta. “Terra treme em Caxias”, era a manchete estampada no Pioneiro da virtualidade.
A resposta que tive foi de fato exagerada ­— ­e devemos dizer que foi Deus quem não nos deixou acontecer alguma coisa mais séria. E este Deus me levou de novo ao Thales.
Formado pela Faculdade de Medicina da Bahia, no final dos anos 20 Thales se muda para o interior, Castro Alves, onde atuará como “verificador de óbitos” da febre amarela que dizima a região. Anos depois, das observações cotidianas e das relações políticas escreverá uma novela cujo título é esta pérola: Foi Deus não acontecer nada.
O título (que esconde com domínio de mestre o “por obra de”; ou a duplicidade do verbo, “não deixar acontecer”) é daqueles que resume tudo. Depois de quase dois meses de chuva, quem sabe a água tenha a ver sim com o tremor aqui sentido. Mas qual! Tanto em Castro Alves com sua febre, tanto agora em Caxias com o seu terremoto, estas coisas que fogem do nosso controle sempre serão justificadas pelo imponderável. Deus!
Mesmo com toda a parafernália tecnológica que inauguramos ­­— diria Thales, um cristão convicto­ — perante a natureza grandiosa e, às vezes adversa, somos ainda miúdos.

(Texto para o Pioneiro de amanhã. Acima, uma velha igreja solitária na gravura de Thales).

terça-feira, novembro 4

De Mathilde a Rouanet

D. Mathilde deve ter olhado para o velho Olavo e dito, “humm!”, sobre a fusão do Itaú com o Unibanco. D. Mathilde era a esposa do banqueiro Olavo Setubal, que morreu antes dele, pois o Olavo do Itaú, como sabemos, faleceu faz uns dois meses. O negócio é que eu também fiquei aqui com uma dúvida agora. Não sei se é sintomática a união dos bancos só agora depois da morte do Olavo, ou se a crise é mesmo grande, muito maior que a “marola” que o Lula andou por aí falando.
Caso a crise tenha sido mesmo o motivo que acelerou a união dos dois bancos, penso agora nos cortes que logo virão. Na cultura, é claro, que é sempre o que se corta em qualquer debilidade do mercado. O Unibanco tem uma série de salas de cinema em São Paulo, onde se pode acompanhar filmes de arte e, como se diz, filmes de autor. Além disso, tem um projeto bacana que são as Olimpíadas Escolares, que alcança alunos de todo o país.
O Itaú tem o seu braço nas artes e educação exatamente no Itaú Cultural, que promove shows, exposições, seminários, até um encontro de escritores brasileiros, quase inconcebível, que ocorreu há 3 anos, e quando eu pude ver toda a estrutura que eles dispõem na Avenida Paulista.
Acho que, se a crise econômica atingir mesmo os dois bancos, é por aí que acontecem os cortes. E será uma pena. Hoje, Dia Nacional da Cultural, quero relacionar exatamente os “patrocínios” com a nossa Capital Brasileira da Cultura. Alguma programação prevista para hoje, além da reunião do Clube dos Fotógrafos??
Nenhuma. E sabem por quê? Exatamente porque a nossa Capital Brasileira da Cultura não aconteceu, não funcionou e dificilmente deixará legado porque, pelo que entendi, era exatamente nos bancos que se depositava a esperança de se “captar” a grana que faria, de fato, Caxias ser a Capital da Cultura.
Mas, nerusca. Nem Bradesco, Itaú ou Unibanco, até onde sei, se entusiasmaram muito com a Capital Brasileira da Cultura de 2008. E pior, a tal “captação” se mostrou uma embromação burocrática que envolve a Lei Rouanet, papelada só para daqui mais de um ano e que matou Caxias como a Capital da Cultura.

(Crônica de amanhã no Pioneiro).