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quarta-feira, janeiro 27

Lula, o pintor mal-assombrado

O Tom Jobim contava que o Ary Barroso chamou ele e uns outros caras lá no quarto e disse: “Vou morrrrer!” O Ary falava dobrando os “erres”, tinha um “humor irascível”, e morreu na manhã do carnaval que o homenagearia. Tom contava isso prolongado, dando cores, e a despedida dos amigos é tão profundamente humana (tempo de convivências. Imagina o Ary tuitar o “morrrrer” dele hoje. Não teria a essência), que hesitamos em acreditar que seja verídica. Mas, vinda do Tom, só podia ser.
O Tom ia no Ary Barroso pra falar de futebol. Não por acaso, no dia daquele “anúncio” estava com eles José Maria Scassa, da Grande Resenha Facit, da TV Rio, famosa mesa-redonda sobre futebol.
Ary fora locutor, torcedor do Flamengo, e foi decisivo na construção do Maracanã no... Maracanã. Em 1947, quando Mário Filho fazia a campanha em A Manhã para a construção do maior estádio do mundo (170 mil lugares), visando a Copa de 50, um jovem vereador comprou a briga. Carlos Lacerda.
Ruy Castro, na biografia de Nelson Rodrigues, irmão de Mário, conta que Lacerda, vereador da UDN, surpreendeu dizendo que o estádio deveria ficar em Jacarepaguá. E que aquilo “era um insulto aos dinheiros públicos”, que o estádio não precisaria mais de 80 mil lugares.
Jacarepaguá era tão longe que os cariocas teriam de “tirar passaporte” pra ir. E Mário não recuava da sua obsessão em ver o Maracanã ali... no bairro Maracanã. Mas Lacerda era duro e ganhou adeptos. Um de seus argumentos era que defronte ao futuro estádio havia o esqueleto de um hospital.
Da tribuna, Lacerda decretou: “É uma vergonha construir um estádio defronte a um hospital nunca terminado!” Era um argumento e tanto. Mas Mário Filho respondeu: “Exatamente por isso. Quanto mais estádios de futebol, menos precisaremos de hospitais”.
Mário cooptou então para a sua causa o rubro-negro Ary Barroso, também vereador e também da UDN. Com seu prestígio o autor de Aquarela do Brasil rachou a bancada de Lacerda. Em 1950, o Maracanã, no Maracanã, era inaugurado.
Foi uma das tantas encrencas de Lacerda, excelente orador, que se destacaria pelo confronto. Ruy Castro, na feira daqui, ano passado, disse que a biografia de Lacerda é uma das mais evidentes a ser escrita. Lacerda era jornalista e, por acaso, encontrei agora uma de suas reportagens. É dos anos 40 e com o seguinte título: Lula, o pintor mal-assombrado. (Continua).

Crônica no Pioneiro de hoje.

quarta-feira, janeiro 20

Já sou filho de Caxias

Eu nunca falei desse assunto aqui, porque achei que não interessava, nada acrescentaria ao leitor. Mas a vida nos prega peças, e eu não vou perder esse assunto para a crônica agora.
Em 2000, terminei um doutorado na PUC. Pois bem, somente na semana passada fui pegar o diploma. Quase dez anos se passaram e só agora fui buscar o diploma. Seria isto desapego ou o cúmulo do desprezo? Não chegava a ser mágoa, confesso, mas certa desilusão, que vocês logo vão ficar sabendo.
Quando na UCS precisava do diploma, eu apresentava o documento do Mestrado e anexava a Ata de Defesa da tese. E foi então que pensei: vou me dar de aniversário. Vou lá pegar o papel que é sinônimo de muita luta e conquista.
Faceiro, peguei o diploma e fui até o bar mais próximo saborear o momento. E a surpresa. Está escrito no diploma que a PUC de Porto Alegre confere ao fulano (eu), carteira de identidade tal, nascido em Caxias do Sul...
Quanta ironia. Eu, na véspera do aniversário, tendo às mãos aquele papel bonito e pensando: pura ironia! Passei a vida toda com Bom Jesus até os ossos (torturando os leitores do Pioneiro há 15 anos com Bom Jesus isso, Bom Jesus aquilo) e a PUC atribui meu nascimento a Caxias!?
Seria uma honra ter nascido aqui, e já me sinto de fato muito caxiense por esses 16 anos que aqui vivo. Mas nasci em Bom Jesus, pô!
Decidi na hora. Não vou reclamar, pedir que consertem a minha naturalidade. Vai ficar no meu diploma este equívoco da PUC.
Minha decisão, de certa forma, é uma pena, uma injustiça. Explico. A PUC me acolheu quando fui convidado a me “retirar” da UFRGS. À época, cumprido os créditos e as aulas, apresentei na UFRGS um projeto em criação literária. E meus contos foram considerados “insuficientes” e não havia linha de pesquisa para aquele “desconectado” encaminhamento de criação literária. E tive de me retirar.
Passado o triste processo (os contos logo em seguida foram editados sob o título Valsa dos Aparados), fui prontamente acolhido na PUC, com uma pesquisa que contempla a obra escrita (a criação literária) do pintor Iberê Camargo, que só agora também será publicada. Regina Zilberman e Assis Brasil (aliás, quem orientou a tese com a generosidade que o caracteriza) foram então muito receptivos e, por isso, achei “sacanagenzinha” ter acontecido o equívoco no diploma. Mas vou deixar o diploma assim. Agora mais valorizado como lição de vida.

Crônica no Pioneiro de hoje.

sábado, janeiro 9

Memórias mortas

Fui dar uma conferida no que comemoraria centenário em Bom Jesus em 2010 e nada. Os meus conterrâneos deviam estar se guardando para o grande 1913, ano da emancipação do município.
Pulei então para 1920. Naquele ano, exatamente, foi construída talvez a casa arquitetonicamente mais bela do Bonja. Em estilo moderno, de alvenaria, a casa foi encomendada por Purcínio Mâncio da Fonseca. Fica ainda hoje na Borges de Medeiros, na descida do Banrisul. Conta a lenda, foi construída porque o Purcininho queria ter uma ampla sacada de onde pudesse observar os trabalhos na Fazenda da Balança, distante uns 5 quilômetros da cidade. Mas, a casa se notabilizou mesmo por depois pertencer ao Verenzuki, o sapateiro russo que fixou moradia em Bom Jesus, que é pai da Kátia, esposa do Antoninho Xavier, médico há muitos anos em Vacaria.
De 1930, cabe comemorar a passagem do Assis Chateaubriand, logo após a tomada do Rio de Janeiro pela Revolução de 30, atrasado que ficara em Florianópolis para não estragar os planos de Getúlio. Consta que Chatô veio de São Joaquim, passou por Bom Jesus então na fazenda de Dona Isaltina Borges e na casa do Eurípides Rosa. Naquele mesmo ano, Bonja muda o nome do cinema de Gaúcho para Cine Guarani, antecipando a onda de nacionalismo que Getúlio imprimiria ao seu governo nos anos seguintes.
O ano de 1940 marcará a chegada dos primeiros aviões a Bom Jesuss!!! É a influência de Chateaubriand, que através dos seus Diários Associados patrocinava a formação de Aeroclubes em todo o país. Aquele ano também marca a chegada do judeu Gregório Ioschpe, que comprará o pinheiral do Eurípides da Rosa, dando início a “era da madeira”. Bom Jesus chegará a mais de 100 serrarias, num universo de 37 mil habitantes.
Em 1950, Fortunato Krammer da Fonseca manda construir a casa com os cavalos na fachada, que depois passará a Adílio Palma Velho. Também nesse ano aparece a Escola Eduardo Ganz, a escola dos espíritas, que viviam o seu auge.
Os padres ampliam o salão Paroquial, em 1960, criando o novo cinema na cidade. Helmute Siqueira faz as primeiras pregações com o intuito de criar a Assembleia de Deus no Bonja.
Em 1970, os capuchinhos entregam o Ginásio ao Estado. Heloís Dutra inaugura a nova avenida com o colégio Irmãs Ramos de fundo.
E os anos 80 e 90 já são nossas memórias vivas.

Próxima crônica para o Pioneiro.

sexta-feira, janeiro 8

Crespa III




quarta-feira, janeiro 6

Tríptico para Iberê

Estas capelinhas que visitam as casas mensalmente, quando abertas, mostram no centro a imagem da santa. À direita e à esquerda as duas portinhas semiabertas. Formam um “tríptico”, isto é, uma imagem central, ladeada por imagens laterais acessórias. As portas podem trazer na parte interna alguma figura do altar, ou mesmo a imagem de anjos, por vezes, até mesmo algum oratório.
Nas artes plásticas são famosos os trípticos de Hans Memling, com o seu Tríptico de São João, e Hieronymus Bosch, com A Tentação de Santo Antão. Mais contemporaneamente, o britânico Francis Bacon também construiu trípticos, como a tela Crucificação.
Bem, o que quero relacionar com isto é que, depois de longa espera, talvez lá por março deve sair um livro sobre Iberê Camargo, resultado do I Prêmio de Ensaios da fundação que leva o nome do artista gaúcho. Participo com uma pesquisa sobre o pintor-escritor na obra que traz textos ainda de Daniela Vicentini e Laura Castilhos. O livro se chamará (porque são três ensaios) Tríptico para Iberê Camargo.
E também (talvez em março) pretendo lançar O tal Eros só (Osso relato). Trata-se da história de Sore (Eros), um cara que desde a infância surpreende por suas excentricidades. Usa chapéus como sapatos, faz corridas, sobe e desce escadas e dança tango de costas.
Vai acontecer sobretudo a vida. O caule da folha, o formato do pólen, a novena e a maçã. Vai acontecer uma nuvem de urânio e o Natal no mês de abril. Um sucesso pra nos encher o saco, o progresso, certamente a falta de pão. Vai acontecer uma mosca sem asa, reumatismo, mais amizade, vai acontecer um tufão.
Vai acontecer cocaína em farmácia, acontecer ainda formiga, leitão, senha pública, minha filha querida!, enchente. Desânimo, avassaladora paixão.
Acontecer de cachorro casar... Vai acontecer a respiração”.

É um provocador de caos e, por isso, solitário. Sore quer ser escritor e daí a escrever um livro ao contrário é um passo. Seu texto flui de baixo para cima, da direita para a esquerda, sem perder o sentido. O que se lê de cima para baixo é o mesmo texto de baixo para cima, um texto-palíndromo.
Este projeto foi aprovado pelo Financiarte e o livro terá o formato um pouco maior, para que caiba numa mesma página cada bloco de textos na íntegra. O modelo será Galáxias, de Haroldo de Campos, também um livro que é uma experimentação com a linguagem.

Crônica no Pioneiro de hoje.

domingo, janeiro 3

A estrela atropelada

Em cenas do documentário This is it, sobre os últimos dias de Michael Jackson, o astro diz, “Deus te abençoe”. Pede que Deus dê a sua benção ao arranjador, ao tecladista que tira uma última nota perfeita. Pede que Deus dê benção ao marcador de cenas que ajusta o seu passo em Beat it. Enfim, umas 10 vezes ao longo das gravações ele pede a benção de Deus para o seu diretor Ortega, ou aos seus coadjuvantes no set.
Detalhe: não é este “Deus te abençoe” o mesmo que, não faz muito, a gente recebia em resposta de um pai, avó, ou madrinha. Lembro de meu padrinho João Maria, umbandista, que respondia de bate pronto ao meu pedido de benção. Na rua, em casa, não deixava passar.
Mas, voltando ao Deus nos abençoando do MJ. Seu “Deus te abençoe” dirigido aos protagonistas dos seus últimos ensaios era um “abençoe” de “obrigado”. Ou ainda: isso ficou tão perfeito que é coisa do Pai lá de Cima, por isso, meu obrigado a você, incluindo Ele de tabela.
Mas há um terceiro “Deus te abençoe”, além daquele do meu padrinho e este do Michael Jackson. É um “Deus te abençoe” de uma mãe, no leito da morte, que quer saber por que o filho decidira seguir a profissão de “barbeiro de necrotério”.
A cena está numa das melhores crônicas de Nelson Rodrigues (aliás, desprezando o título direto, “O Barbeiro de Necrotério”, Nelson alcança um outro achado como manchete do seu texto: “A estrela do atropelado”).
Pois bem, naquela história de um jovem que desiste do curso de Medicina para seguir o ofício de “barbeiro de necrotério”, o grande mistério é saber qual o motivo de tamanha mudança. O rapaz nunca revela. Até que a mãe, muito doente, o chama para a derradeira pergunta: por que barbeiro de necrotério??
O rapaz diz que é “para dar na cara do pai”. Era para fazer uma desfeita ao pai, motivado por uma desavença antiga. A mãe, então, diz que já pode morrer em paz, já sabe a resposta. E lança um “Deus te abençoe” ao filho.
A história é bem ao estilo Nelson Rodrigues, com ecos dos Karamazov do Dostoievski e suas tragédias familiares.
Bom, aqui a ligação com o meu assunto: se sabia que Michael Jackson não se relacionava lá muito com pai, pelo contrário. Revelava que foi agredido pelo pai na infância e que aquilo perdurava.
Fiz esta relação agora por ver o pai do Michael (“a estrela atropelada” do meu título) exigindo pensão dos inventariantes do filho. E com prazo estipulado.
Crônica publicada no Pioneiro.