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Prazos
Por que nos impomos prazos? Prazos para mastigar. Segundos para o coração deixar de bater. O prazo da música está em cada nota a morrer. É um prazo bonito. Mas prazo de vida? Um estúpido caso que conheço de carimbo de validade no amor!?!? Prazo pra engrossar as pernas, prazo pra afinar a cintura, o instinto sem-prazo para não se afogar. Há o prazo do peixe e do sapo. O prazo do Sol e da Lua contando nos dedos jamais se encontrar. O prazo do sorriso na foto vale uma alface. O prazo pro meu rosto ter esta minha idade vem de cada espantar. Rugas para a minha dor. Ternura se o jeito é sorrir. E sempre este prazo do blog. O prazo pra falar pouco, não dar comício, ser camelô do meu íntimo e com ilustração. E os meus dois, os meus cinco filhos, se o meu prazo permitir... pr
A alegria de continuar
Eu não sei se já vendeu 300 livros. É muito pouco, é nada. Ok! Mas é nisso que enfiei a cabeça, faz tempo, e não tem volta, cara. É o que a gente sabe fazer e sempre tem uma sobra da “cozinha” que é o que nos dá alegria e um rasgo de felicidade pra ir levando. Como ontem. Passei autografando 50 exemplares numa empresa de uma amiga que comprou os livros para dar como a sua lembrança de Natal. Esta amiga, que prefere o anonimato em várias outras iniciativas bacanas que toma, além de presentear a sua gente, valoriza a cultura e ainda anima o amigo escritor na luta, ela que é irmã de um músico e sabe como as coisas são. Obrigado, guria!!! É por essas que a gente continua. E não vale, então???
Bom Jesus desapareceu
Uma vez, Bom Jesus desapareceu e levou todos os seus filhos. Levou velho, as velhinhas, suas netas, a D. Vitalina e os seus bolinhos de fubá. Seu Manoelão do carrinho do lixo e da bica amava a D. Vitalina também. Um chapéu voou na hora de desaparecer. Um GMC. O pescoço dos fazendeiros. Um casal que fazia amor desapareceu até o último suspiro. Seu Olavinho, Bilinha, o inspetor de passagem, foi justo o nosso fim: Bom Jesus, uma flor, feneceu! E levou plátanos, as vacas holandesas, um disco do Simon e Garfunkel lá da Escolinha da APAE. Os coqueiros da praça, os peixes do aquário, até a D. Odila cega nem pensou. Foi junto, foi com as freiras, todas de Conga. E foi água de poço, foram os processos, os crimes, as mágoas, um perfume de uva e Bom Jesus nos levou. pr
Coisas que vão fazer você tremer dentro do vestido
Eu vou dizer, sem lamento, eu vou dizer, não é sacanagem, eu vou com elegância, eu vou dizer num quase e consegue, eu vou dizer prum punhado de gente, eu vou dizer com dor o que tá na pele do meu coração sem roupa, eu vou dizer. Eu vou dizer rompendo barreiras, chutando em gol, vou dizer sem jeito, dizendo talvez mal-dito, deseducado- eu vou dizer pra você coisas com os pés. Eu vou dizer com um sorriso! Eu vou dizer pra você inteira, vou dizer com gesto, fala, olhos, com o corpo, eu vou dizer sem ser pedido, ajuda, eu vou dizer como uma ventania, pomba, caramba!, eu vou dizer como um frio concreto o sussuro, o meu murmúrio consciente, sem grito que prejudique, quem sabe a tua plástica, eu vou dizer pra você, ginasta, coisas que vão fazer você tremer dentro do vestido.
pr Escrito depois de ouvir Rua Ramalhete, uma velha canção do Tavito
Um filho com você
Amor, se humilha Ah, bobagem se fez Amor que desinteressa Enfraquece a pureza A flor E finge É cena Despiste Amor, se humilha Não peça mais Amor, se humilha, não faz filho com você! pr
A moça indo à praia
Espelho A caminho Estender Pausa da cor No tanque Varal pr
Só vou dizer as iniciais
Só vou dizer as iniciais do nome dela, as iniciais em 30 linhas, o resto complete você. Só vou dizer as iniciais da sentença, as iniciais dos que pensaram em doença, no meu último pedido, talvez. Vou dizer e vai ser hoje, vou dizer quem é vaidoso, as iniciais do cara mais chato e daquele fiasco também. Do vinho da safra seca, as iniciais que mais nos irritam, de como se fica rico, da fórmula de ser feliz. Direi as iniciais do teu filho que vai nascer! Só vou dizer dos meus rins em estrago e que me botam a repetir: as iniciais da moça bonita, a deusa da minha rua (a deusa da minha rua?), diga o melhor café! As iniciais de onde vim? pra onde vou?, só vou dizer o cardápio, da escalação do meu time, as iniciais de um Lenny Kravitz e de um grande bafão. Você sabe as iniciais da Bíblia?, o que está lá no fim? As iniciais de quem toma Pepsi e as minhas primas irmãs. As iniciais do Pai Nosso, o que dizer nunca posso, inicias do que não serve e a minha profunda opinião: não gosto de erva-mate. E nem da outra, eu cuido com as palavras, vejam vocês! Iniciais em louça antiga, da marca de um mouse, de um link, as iniciais de um site pornô. Do que os meus tristes olhos enxergam só digo as iniciais. Não vou dizer, vou cooperar comigo também. Só vou dizer de um violino, de um lugar com bastante peixe e cogumelos iguais. As iniciais da minha ajuda, as iniciais da melhor fuga, o segredo para dormir. A inicial de uma carta do baralho. Que início a saudade tem? As iniciais cravadas na árvore, as iniciais de um coração, tatuagem, da pílula que mais agüente e as benditas inicias: na cruz de Jesus, as iniciais do teu tipo de sangue, do galã de bang-bang, estratégias do meu Xadrez. Só vou dizer as iniciais da idéia e de uma ação pós-moderna que chamam ONG. Só vou dizer e vai ser hoje, as iniciais pro progresso, o resto trabalhe você! Só vou dizer as iniciais como um túmulo. pr
Recomeços (ou o bom emprego de duas vírgulas perdidas)
pétala de um antigo amor, também oculta, solidária, és consolo e longo é o tempo do meu recomeço, teu presente pr
Tomates argelinos
Desisti. Não encontrei a passagem que me trouxe num vôo árabe no retorno de Toulouse em 1988. Passei um ano no Sul da França convivendo com argelinos e, como eles, passando à base de tomates, pão e galinha. Ex-colônia da França, há muitos argelinos em Toulouse. Os conheci na universidade e, não é lenda, brasileiros são mesmo confundidos com árabes, deixem uns fios de bigode pra ver. Houve uma imediata identificação por sobrevivência. Eram africanos exilados no auge da Frente Nacionalista, ultra-direita, racista, comandada por Jean-Marie Le Pen. A aproximação com meus semelhantes, naquela condição, imagino, tenha sido uma forma de me proteger. Daí que passei alguns domingos entre eles, servido de tomates fatiados em triângulos. Era o que podiam os meus colegas, filhos de pintores de paredes estabelecidos em Toulouse. Havia entre eles duas argelinas lindas. Seguidores do islamismo, comentavam as guerrilhas internas que disputavam o poder na Argélia à época. A família era admiradora de um líder barbaramente assassinado que, francamente, já não lembro o seu nome. E assim foi o meu inverno em Toulouse, o grande centro de construção de aviões da Europa. E gorou a minha bolsa de estudos. E fiquei sem grana e tive de apelar ao Serviço Social pra voltar. Levantaram uma passagem e não encontro agora em meio às cartas o bilhete da volta. Gostaria de comprovar se a empresa que me trouxe não pertenceria ao pai de Bin Laden. Provavelmente, sim, não sei. Era algo como Linhas Aéreas Iraquianas, desconfio, mão não encontro. O fato é que o vôo era originário do Golfo Pérsico (tinha uma batelada de gente da Mendes Junior, que andava em Bagdá fazendo estradas). O vôo era via Paris, escala de quase oito horas em Casablanca. Como se vê, era um vôo para pobres. Lembro o avião tomado principalmente por muitas mulheres árabes com suas crianças. E que durante a travessia do Oceano Atlântico caiu a tampa do ar condicionado sobre a minha cabeça. Como esquecer aquela tampa, os tomates divididos, os argelinos de Toulouse que, espero, estejam em paz! pr
Reler cartas em dia de chuva
Eu gosto de reler cartas em dia de chuva. Eu tenho um punhado de cartas, são amizades antigas que nunca vão me deixar. Endereços perdidos, cartas anônimas, cartas já sem face, tem até de uns caras famosos que, se vendesse, daria um apartamentão. Eu seleciono hoje uns e-mails. Mas o que gosto mesmo são as velhas e sinceras cartas dos amigos. De um casal, por exemplo, de Toulouse. Venderam tudo e foram morar num barco no mar. Da garota de Lisboa que queria ser atriz e quem sabe um dia me amar. Uma carta de morte de uma amiga de minha mãe. As cartas de Veneza de um Diogo, quando recém-começava a ser Mainardi. Em dia de chuva eu penso muito na Baronesa do Gravataí. A grande falta que essa rua de Porto Alegre faz. Só sobraram as cartas de lá. Cartas que não respondi. Sem resposta também ficaram os argelinos que dividiram seu prato e a saudade de um primeiro Natal muito só. A argelina vestia a cor azul. Há cartas de coração, a maioria. E há cartas aqui comigo elegantes, outras semi-alfabetas, as cartas de minha vizinha menina no orgulho do primeiro escrever. Bom Jesus. Bom Fim! Reler cartas é como refazer as bagagens e sair viajar. E é um continente à disposição aqui no sofá. Em cada papel uma cor, uma dor, esperança, felicidades adiadas, perdidas, amores que podem estar em Macau. Em Londres. Em Erechim? Leio todas as cartas de improviso porque considero sacanagem deixar de cada uma tocar. Ao reler cartas atualizo meu coração. Volto a vestir a moda com a data que o selo trouxer. Reler cartas nos faz rebrotar um sorriso que ande difícil talvez. Reler cartas é saber do cachorro de Marina que se chamava Arthur. Há uma carta quando o Arthur morreu... Ao reler cartas morremos assim de novo e se acha um fio de cabelo. Um pensamento de mulher envelopado, uma flor a se guardar. Ao se reler cartas, em dia de chuva, a gente murmura: merda! pr
Simples
O simples é a dança do traço pr
Vincos
as voltas que a lágrima faz no rosto como o fim de um perfume persiste pr
A batida do surdo
A batida do surdo é batida sentida, é batida sem ouvido, é chamar sem ninguém atender. pr
O andar do homem sozinho
Em cada quarto improvisa O homem que vive só Nunca desfaz a bagagem O homem no seu andar pr
A arte vulgar
No que escrevo ou desenho Acidento a paisagem que havia Se mais a borra ressalta É culpa da poesia Terra Água Tacho Gente
Em cada escolha eu aprendo O justo expressar que importa A tristeza tornada então bela Vulgo arte, tanto há vida
Estudos p/ um autor s/ assunto
Estudo para iludir água no pescoço Estudo para iludir fotografia Estudo para iludir cigarro aceso Estudo para iludir barriga vazia
A noite por fim te foi leve
Não amem!, gritava a louca. Não amem!, parecia um consolo, Não amem!, triste de ouvir. Louca, louca, louca, ela gritava bêbada e jogaram uma flor. Uma flor como uma sátira de porta de bar. E estava ali. À porta do bar e beijou a rosa. E entre o fio dos lábios calmamente esse balbuciar que era da mais pura estimação: Não amem! E disse, não amem! E aumentou o volume de sua loucura e com a flor junto ao peito nesta lamúria sentimental abusou com todos à porta a hipotética cravada que levou ao peito. Hipoteticamente se cravava e gritava, louca, não amem! Havia estrelas no céu e o céu era pobre. Era um violento céu para a tristeza dela, tristeza bonita, havia a rosa em seu peito. Ah, homem em fuga, ah, homem filho da mãe com seu tempo de lábios quentes quando fez o coração dessa mulher só seu. Único. O coração de uma mulher no mundo só pra ele. E não soube ele o coração! Abram! Rasguem também com ela agora o vestido por isso: não soube ele o coração. Louca. Louca de amor. Agora o peito, mulher descalça, seu humano sofrer. Urro de não amem perfeitamente bom. No chão, seu olhar. Estendam a mão ali. Estendam a mão e façam deste um momento de amor. Momento de amor porque dói o peito dela. Porque é o seu coração! Louca. Louca que não ama mais. Louca que amará louca pra sempre o seu único homem a quem acenou o buquê. A quem acenou o amor, o carinho que lhe deixou aos pés. Louca e espaçosa agora. Louca com essa rosa presa às mãos. É uma cena apenas. Uma cena triste, cena de amor. Mulher que não chegou a ser mãe. Mulher apenas que brada desmedida o seu apego ainda mais. Loucamente apaixonada com seu terno aceno de apego a negar: Não amem mais. Pisa o cascalho e grita ao seu desvalor amando ainda, louca, louca, em si. Não é fuga. É amor. Sigam seus dentes. Seus dentes rangem, vejam! Seus dentes trincam, vejam!, e ela pede com puro olhar de mãe sem ser. Só amada, amante, erguida que se vai. Mas haverá cela, tamanha prisão para o que levam? Nenhuma grade haverá. Cárcere nenhum ou beijo longo que lhe aplaque esta imenso amor haverá. Não amem, grita. E a cidade, com seu afeto materno, acolherá a sua filha assim. E ficará só o silêncio. Só, só e só. pr
A sublime arte de manter os porcos batizados
Quebremos agora os copos, mãe?! Quebremos! Quebremos agora os copos! Dor, porco, sofá. Cada garfo e faca eu escondo. Em vida, cada um desses garfos e facas teve o teu capricho, o teu zelo que sobrou. Morta, o mesmo garfo e faca, o mesmo quebrar de copos que contigo aprendi, resta. Restos e sobras. Os cacos deixados, lençóis com teu cheiro, marcas tuas, tuas manchas de batom persistem ainda aí. Sobram teus lábios naquele rústico pano que à boca trouxeste. Eu o guardo. Pano de prato que desbota e mantém o rubro batom que usara já doente, já bêbada, decerto transtornada pelo teu abobado AVC. Amei só teu pai, costumavas me dizer. Amei um homem só no mundo e esse homem foi teu pai. Esse pai que não tive, esse que foi se escapulindo, lomba do cemitério acima, buzinando seu caminhão. E se foi buzinando e nunca mais o vi. Não guio, por isso. Mal dirijo agora meus passos, minhas poucas palavras nestas sobras que me coube resguardar. Faço o que mesmo? Faço o que, perdido, se já nem há porcos que se remexam com o teu doce aproximar? Mulher da pia, carinhosa, tratadeira mandada, minha mãe dava nome aos porcos. Eu tenho a tua lavagem agora em minhas mãos. O que faço com a lavagem? Meus lábios não aceitam a palavra tenebrosa: mãe, se morreu. Meus lábios não aceitam a discussão por sofá. Como herdeiro, herdeiro universal, decido que este é o melhor canto para o sofá azul do teu mau-gosto. É só puxar mais pro canto e esconder. É só isso a herança. E o que afasto daqui também são as tigelas, essas coisas pouco usadas por um homem só. Não quero classificar tua herança, o teu mau-gosto por isso e aquilo, que fique teu espólio assim, na desarrumação. Resguardar. A memória é uma lágrima e tenho em minhas mãos o teu par de brincos. Espelho de açude eram meus olhinhos. E eu agarrava teus brincos retorcidos como um pequeno anzol. Menino, grudava em tua orelha pra dormir. Pegava tua orelha aconchegado ao peito. Aconchegado em nossa volta quando nos disseram não. Não, não batizo, és solteira! A mulher da pia e lavagem não tinha direito à pia batismal. E fomos então aos porcos. Tu, solteira. Eu, gorduchinho, pagão. Não batizo! O que sentistes nunca contastes, ô, mulher resignada! Pia, prato, copos, os talheres devias quebrar. Não me ensinastes como se quebra talher, o aço, a pedra do coração. E devias. Copos não me bastam, copos não me bastam quebrar. Como preservar tuas coisas se não quebrar agora a pedra imensa desse coração? Eu, merecedor de teu afeto, teu filho, pagão. Já não rezo. Nunca rezei. Sabes, choro, mas choro como aqueles que trazem os olhos esgazeados como o santo que mantinhas em tua cabeceira ali. Os paninhos de tua higiene íntima também à cabeceira. A primeira dor de dente também ali. Ave Maria, não! Pai Nosso, não. Não batizo! Não batize! Ela dava o seu corpo mesmo, viu padre! Vendia o seu corpo, colaborava com a casa, me fez o filho pagão! Isso é rezar? É a minha forma. Um Pai Nosso que não há. Maria que não houve. O pai que escapuliu. As mães solteiras quebram copos mas deviam quebrar bem mais. O aço, a pedra, as mães solteiras injuriadas deviam levar a lavagem ao altar. Sou solteira, tive ele, mas eu sou gente também. Burra ainda em dizer. Tive ele, vivo na pia, tive ele e nem me resguardei. Burra ainda em dizer. Voltei tão triste, quebrei os copos, o senhor não batiza o sonho meu? Burra ainda em contar. Ele era execrável, ele só deixou que o filho agarrasse em sua orelha ainda mais. Para que se aconchegassem os dois, para que se protegessem ao voltar. Protegesse teu açude, protege quem tivestes, quem querias sempre com os seus passinhos, as unhas sujas, a dor de dente, o infame rastejar num porão para espiar bucetas desconhecidas. Ele é meu. Não vão me prender? Ias depois em casa, baixinha querida, com a tua marmita e dizias: não te querem mais lá, mas eu te trago comida. Me dê um abraço aqui. Não te querem mais lá e agora é comigo. Mexeram comigo e eu que não vou deixar. Eu que te tive, deixem ele. Tranco em casa, ele é meu! Brava mulher em seu pranto e instintivo esforço para o aconchego do que pariu. E daí que permaneces, ficas ainda agora aqui. Morta. Agora sou eu quem te deixo em casa. Agora sou eu quem estendo a orelha. Afaga. Aconchega tua mão morta na orelha do teu filho! Pode sim! Pega. Aconchega. É de arrepiar. É de arrepiar sentir a mão assim. Há um estalo de madeira velha que esta mão trouxe junto. É a nossa antiga casa, a casa que eu não trouxe. A casa é o coração, vida, é a doce presença de alguém que já não está. A casa. A ca-sa. Minha Lolita soletrada em tábua, paredes, na ausência do teu amparar. Aconchego bom, aconchego que se foi, devolvida a casa, que fazer? Sobras, restos, migalhas. Herdar. Não há mais porcos. Os porcos que alimentavas na ronda e pranto de tua vida. Teus vestidos outros corpos já estampam o dia bom, o alaranjado gritando ali. Também eram ruins as tuas flores em lata com jornais. O mau-gosto que herdei. Jogo as flores na lata pela janela. Espatifam-se lá em baixo. Meu quebrar de copos e latas, menos o aço, como contigo aprendi. Daí que a pedra persiste neste coração que pinga e me ocorre envolvê-lo também com jornais. Lembro de uma mãe. Eu lembro. Cada um que se lembre. Lembre os brincos, os paninhos de higiene, o Sagrado Coração em cada mãe. pr
Simples
O simples é um engano cortês da complicação pr
Ironia
ironia é a atração de um sorriso impaciente pr
Distração
distração é a paciência com um sorriso pr
Perguntar é poesia
um filho que dá no estômago é quando a prudência se vai? e a tristeza que dá na abelha se o encontro marcado melou? a beleza que cai na casa se a chuva de azul se lavou? e a carambola que faz a espuma se a urina é só chimarrão? pr
Perguntar é poesia 2
a inveja que dá no branco se casca no azedo é limão? e o quanto cabe em despiste se há pernas sentimentais? que vontade que dá no jogo jogar sem Danrley em Grenal? a lomba é como saudade e o velho se faz guri? pr
Tarde
Ia à tarde, erguia os pés Ia tarde, só muda de roupa, ia tarde por distração Tonto, idiota, desprezo, paciência!, mais cabeça no coração Por ordem de horário, ia à tarde, deixaria de amar Ia tarde, afilhado da dor, ia, automático, infeliz! Já ia fora de horas, ia, calendário vencido, ia tarde de humor Por coração, ia à tarde, e, como o vento, escrevia na areia com os pés pr
O que se deixa ver
O que se deixa ver toma banho de grandeza acaso se trate de amor pr
Lavar a roupa
Lavar roupa é se expor, revelar por inteiro, é tirar os disfarces, a febre do molho, o gozo, o repouso, o que a semana escondeu. Arejar. Descolorir cada mancha. Lavar a roupa é, é... é judô por amizade!... só forma de exibição. É uma área pro serviço completo: calcinha, sutiã, os lábios das calças abertas, do mais íntimo à largura dispersa, não é, quem sabe, um truque de mulher chorar. Ou não cai do varal uma lágrima? Ou não balança ali a roupa de uma mulher sozinha? pr
Música feia
Tem a música pra desânimo e música pra céu escurecer. É só fechar os olhos e ver como dá na gente, no coração: a música. A música das grávidas. A música triste, a música do dedo em poema que é o solo do violão. Há música pros pés descalços, toquem música sem embaraço quando sofrerem de amor! Música crítica. Música de um Tiririca, música feia, parceira do elevador. Música no vácuo, de boxe, do soco. A música que faz a asa quando se alça num vôo. Hinos. Música pro marmeleiro. E tem a música que cresce aqui no pomo de Adão: no tenor, na garganta dele, no uivo do lobo, a música mais feia é a da noite, o crocitar do urubu. Música de menina, menino, música na porteira, Aquarela do Brasil. Há a música pra dançar. A música pros pés juntos, música feita portanto pra defunto levantar. Música com utilidade, tem música até pra cidade, a maravilhosa canção. Música na rampa, Ronda, a música de sampa, tem música tocada em sanfona, mas que chamam bandoneon. Violinistas, flautistas, galegos, a música lá do Flamengo chama à Teresa, Tetê!. Salve Jorge, simpatia! E salve o outro Jorge e a sua reflexão. Há música pra todo o mundo. Rock, fox, pagode, marcha-militar! Música pra boi dormir. Há música em corpo de moça. Música-música-música música nervosa, a pura distorção. Música com caroço. De lata, há música até de astronauta, música pra gente se lavar. Um canto no banho, música que alegra cadeia, música pra namorar. Música da amizade, destreinada, pesada, música pra ouvido ruim. E é uma música de bosta!, diz o músico bom. pr
O desaguar dos cabelos
O desaguar dos cabelos é um ritual é a mulher em sua melhor pose é a mulher, trama da espécie, em seu pleno poder o seio bate à coxa — relíquia, segundos — recomeça a eternidade no dorso que então curvou A mulher após o banho se inclina pra demarcar Jogar a toalha, para ela, significa vencer pr
Saudade
Saudade sem tamanho...
Do que lembro
Meu vô Bento subia em pinheiro De meu pai só ficou a buzina O meu tio que perdia no snooker Se queixava de um rim que crescia pr
Da série Pai sem filho
a criança era triste como um circo dormindo pr
Haikai
Aponta o dedo desaponta o lábio despedida pr
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