Segunda divisão

Em 1900, faz a representação do que encontrara aqui. Numa peça de grande dimensão, aparece a vila, casa, bodega, animais, a pequena rua. E ainda uma lavoura, espigas, um menino que segura uma enxada, a nascente agricultura. Com este trabalho conquista a medalha de ouro na Exposição Estadual de 1901, em Porto Alegre — então o maior espaço para os produtos do Rio Grande, e com uma seção para as artes.
Seus filhos também seguiriam na arte sacra e com um ateliê que fez história. Michelangelo, o filho do meio (autor da imagem do Senhor Morto na Igreja do Santo Sepulcro; que nunca fui conferir, minha fonte é o Athos Damasceno) casaria com uma filha de Pedro Stangherlin.
Acontece que Stangherlin era o grande concorrente de Tarquínio. O conhecimento da arte que dava autoridade a Tarquínio, contrastava com Stangherlin que chegou aqui antes, em 1876, entre as primeiras levas de imigrantes.
Autodidata, Stangherlin trabalhava a escultura em madeira. Fez uma N. S. do Carmo, que pertence à catedral de Caxias, e a imagem de N. S. do Caravaggio, lá no Santuário em Farroupilha.
Tarquínio tinha escola. Stangherlin, talento espontâneo. Por isso, talvez, Stangherlin jamais se conformou com o segundo lugar naquela exposição de 1901, perdendo para Zambelli. Dedicou 11 meses de trabalho também na representação de Caxias, uma jovem colona em trajes típicos, trazendo a bandeira brasileira e nos cabelos uns cachos de uva.
Irritado com a decisão do júri, Stangherlin determinou o imediato recolhimento da sua escultura e a devolução para casa. Na volta (lancha até o Caí e carreta até Caxias), estragaram a estátua. Apesar de várias propostas de compra, sequer retiraria a peça de um caixote. Ficou guardada durante 11 anos até a sua morte, em 1912.
Aquele inconformado Stangherlin, por certo, refutaria este “espírito segunda divisão” que tomou Caxias em 2008, seja em música, teatro, literatura, na visão de mundo, enfim.
(Texto publicado hoje no Pioneiro. Acima, Estátua de Jesus, de Michelangelo Zambelli).
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