O silêncio da liberdade
John Cage foi um moderno compositor americano que sempre se interessou pelo silêncio, tendo inclusive escrito um livro com este título, Silence.Em 1952, “compôs” 4’33’’, uma sinfonia de nada, de não-sons, regida por um maestro que entra no palco, vira a partitura, pega a batuta e fica estático com a orquestra igualmente congelada. Parece que vão tocar e não tocam. A sinfonia é feita então pelas tosses e pigarros, revirar de gente nas poltronas, impaciência de uma platéia incapaz de suportar quatro minutos e trinta e três segundos de absoluto silêncio.
Eu coloquei isso aqui no blog e aqueles que visitaram a postagem sabem a angústia que isso dá. Você percebe então nitidamente os sons ao seu redor: o barulho da rua, do seu prédio, o avião da GOL, as buzinas e um ruído contínuo que é o deslizar dos pneus.
A partitura do velho Cage é composta de nada. Mas ela nos enche de sons e vida. E este foi o seu grande barato ao criar o 1º, o 2º, o 3º e o 4º movimento da composição.
O NADA. E eu sei que há muita lição nesta ausência (e eu a confirmei ainda mais em plena Sexta Feira da Paixão, tantos foram os cânticos e falação junto ao corpo do Cristo Morto. No seu interior, por outro lado, a catedral impunha uma solidez de silêncio que dizia muito mais. Quem anda por lá sabe que a catedral é um refúgio!).
Parece até que estou sugerindo aqui (e o pessoal do ioga haverá de rir) uma espécie de budismo sem prática, uma espécie de budismo feijão-com-arroz como só numa crônica a gente é capaz. O fato é que John Cage sempre foi um estudioso das filosofias orientais. Ele se inspirou mesmo no i ching, o livro de oráculos chinês, para algumas de suas composições, composições ao acaso, diga-se.
Cage sabia da força do silêncio, que o silêncio pode ser inquiridor, contestador, o silêncio pode provocar a reação de uma arma pacífica.
O mesmo silêncio que agora “grita” mundo afora. Um silêncio que vem do Tibete e se alastra. Pela liberdade.




















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