OBRA     AUTOR
         


Vitrola dos Ausentes
Clique aqui e leia um trecho.


Nova Edição



Clique aqui e leia.


DEMAIS LIVROS


Glaucha
Clique aqui e leia um trecho.



Iberê
Clique aqui e leia um trecho.




Valsa dos Aparados
Clique aqui e leia um trecho.




Missa para Kardec
Clique aqui e leia um trecho.



Quando cai a neve no Brasil
Clique aqui e leia um trecho.


Cozinha Gorda
Clique aqui e leia um trecho.


As luas que fisgam o peixe
Clique aqui e leia um trecho.

Coletâneas


Meia encarnada, dura de sangue
Clique aqui e leia um trecho.



Cem Menores Contos

Clique aqui e leia um trecho.



Contos Cruéis

Clique aqui e leia um trecho.



Contos do Novo Milênio

Clique aqui e leia um trecho.




 

sexta-feira, junho 22

O passo do socorro

Nos cultos do pastor pra fora, o ônibus sempre ficava depois da camioneta em fileira. Depois que conferiam as crianças, o pastor e as duas filhas dele desciam do outro carro.
As mulheres vinham bem na frente do ônibus e algum deficiente.
Quem tinha mais carro, bicicleta e gente, ganhava da outra igreja de vilinha ou serraria, onde eram muito evangélicos.
Daquela vez, na excursão até o Passo do Socorro (se dizia assim por causa da pontezinha no rio), nem deu pra organizar direito. Caso não chegassem em tempo, por volta das 15h, iam ter de pedir, no outro domingo, uma nova licença pro Promotor. Pra saírem de ônibus levando criança e mais aquela porção de crente, entre eles o Pauzinho.
O Pauzinho tinha perdido as pernas no corte das toras e tinha só um retrato que fizeram dele no começo de uma outra primavera; bem mais novo. Daquele jeitão de corpo inteiro dele nas fotos e a roupa transpirada. Apenas o sorriso antigo ele ainda tinha.
Como é que ele não bebia depois que ficou sem a perna?
Sangrando as mãos, uma vez, ele insistia em dançar com a música do toca-disco da Lucília, que tinha trazido uma amigas em casa. Ninguém sabe, agora, depois que nunca mais se viu o Pauzinho, como é que ficou a perna dele. Ele foi convidado pro aniversário da Lucília e foi o que mais dançou.
Mas o Pauzinho que ficou sem as pernas nunca se queixava. Só um dia o Pauzinho protestou: foi porque tava muito escuro pra ele descer a escadinha do corredor das prateleiras de sabão.
De-bundinha daquele jeito, no corredor com a luz queimada, ele ia caminhar com as mãos olhando pra trás, porque vinha a luz pra ele lá de cima com todo mundo olhando.
Todo mundo da casa da Irmã Amância que ficava olhando pro Pauzinho, bem pequeno, ainda mais no escuro.
Sempre lavando o rosto com bastante espuma o Pauzinho criou dois caroções no corpo de uma ponta à outra.
Quando ele andava bem de saúde ele voltava pro porãozinho onde morava só de noite. E ele tinha sono e não dormia. Garrafinha de mentruz pra dor nos ombros, ele gostava de uva e tinha uma gavetinha cheia de sutiãs. Um guarda-chuva. Mas era preciso chover muito pra ele sair de guarda-chuva.
Não tinha um que não gostasse do Pauzinho na serraria porque ele não se desesperava.
A Irmã Amância dizia que era obra de Deus! E que ele orasse e quando pudesse acompanhasse os cultos.
Por isso, o Pauzinho tava junto no Culto do Passo. Foi pra engrossar a caravana e também por pedido da Amância, que lhe amava igualmente bem como a criança dela.
E iam já voltando do culto quando começou a chuva forte. Desabou um temporal e o Passo já foi enchendo e já se viu das cabeceiras o que tava por ali juntado: passava o que fosse de plástico e pedaços de cerca, repolho, flor, até um balde.
Passou emborcado e o balde como um barco fazendo as marolas.
Cá e lá, a preocupação com as crianças.
Nisso!, num pau, arrastado por ele, viram a guria.
Jesus, Jesus!, era a guria de onde o Pauzinho morava.
Ia levada nas águas, ela, as raízes, a podridão das beiradas.
O rio como um louco e foi quando o Pauzinho se jogou no Passo. Daquele jeito mesmo nadava de costas e barriga, parecia até, na água, a um homem semelhante.
O sem-perna e a crentinha só foram vistos depois com as lanternas.
E numas duas noites seguidas, o Pauzinho dormiu como um trapo.
pr