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sábado, maio 6

Meu encontro com Quintana

O escritor gaúcho Paulo Ribeiro recorda seu encontro com o poeta Mario Quintana: uma tarde inteira diante do televisor, regada a muito cafezinho. A visita renderia - no dia seguinte e por escrito - uma breve mas bela entrevista.
— Olá, Seu Quintana...
— Sou!
— Poderia...
— Não!
Foi mais ou menos assim, com esta blague, que conheci Mario Quintana, em 1985.
Naquela ano, o poeta mudara-se para o Hotel Royal, na rua Marechal Floriano, no centro de Porto Alegre. O então Rei de Roma, Paulo Roberto Falcão, recém havia comprado o hotel e convidara o poeta para morar lá, pois Mario andava sem paradeiro.
Por intermédio de um amigo, um conterrâneo de Bom Jesus (Mauro, que era garçom no hotel e fazia as “comprinhas” para o Quintana — cigarros, balas, apostinhas em jogos variados — e que era recompensado com livros autografados, que guarda com zelo ainda hoje na portaria do Hospital Saúde, em Caxias do Sul, onde trabalha) cheguei ao inacessível poeta.

À época, estudante de jornalismo, o motivo de minha visita era aquele mesmo: uma “entrevista”. E só o Mauro para convencê-lo.
Era uma tarde muito quente, lembro. E o diabo, então, com aquele calor, era saber qual o Quintana abriria a porta, atendendo ao pedido do seu prestativo amigo.
O poeta me recebeu acompanhado de uma jovem estudante, Sandra Ritzel, que acabou se transformando na companhia de Quintana até o final da vida.
Havia muitos Quintanas, diziam. O Quintana que conheci era um cara brincalhão e feliz, apesar da modorra daquela tarde. À vontade, desfolhando jornais pelo chão (tive a impressão que o poeta lia o jornal por partes; a cada quatro páginas que lia, a desprendia do corpo do jornal, jogando no chão as descartadas).
Páginas de jornais pelo chão, lambuzando-se de rapadura, lá estava o Quintana. Um ventiladorzinho ligado e, à cabeceira da cama, a térmica com café preto. Tão logo me recebeu, deitou-se, pés espalhados pela cama. Mais do que cansaço, era um “empreguiçado” animal que estava ali aos 79 anos.
E começou a falar muito, comentando o que aparecia na tevê então ligada. Duas crianças na publicidade:
— Não gosto de gêmeos... eles nos dão certeza da nossa condição de animais... todos parecidos uns com os outros!
E seus dois olhos, gêmeos também de tão azuis, acenderam-se ao falar de Piazzola. Por algum motivo, Piazzola, na tevê, tinha entrado na conversa. E nada da entrevista.
Quintana me enrolava com sua atenção, e eu nervoso querendo logo fazer as perguntas. E o poeta pigarreava e dizia lá duas coisas antes de um novo café.
E ameaçava:
— Olha que eu não concedo entrevista nenhuma. De onde você conhece o Mauro?
E assim passou a tarde. Aquela tevê ligada e cafezinhos às 14h30min, 15h40 e 16h50min.Era um “cafezeiro”, eu comprovava (e também a lendária foto da Bruna Lombardi emoldurada!). E, assim, como ofereceu a rapadura, um café, com o mesmo simples gesto, a mão estendida, o poeta Mario Quintana, cansado, certa altura me botou pra fora do seu mundo.
— Mande pelo Mauro o que quiser, que eu te respondo.
Assim foi feito. Deixei na portaria a minha pauta e, dia seguinte, já recebi o manuscrito do poeta. Infelizmente, suas respostas restam esquecidas (não perdidas) em meio a caixas de andanças e mil mudanças da vida.
Sobrou, contudo, a entrevista. Ela foi divulgada no jornal interno do Grupo Olvebra, onde eu estagiava, à época, na área de Comunicação. É um material até certo ponto singelo (pela minha inexperiência e condição de fã naquele encontro), mas inédito, pois circulou apenas entre funcionários, em 1985.
Texto publicado, hoje, no Caderno Cultura da Zero Hora, e também reproduzido no Pioneiro, de Caxias do Sul, p. 22.
A foto acima é de Eduardo Vieira da Cunha