Andando dormindo no mar
— Ficava bem assim.
— A gente dizia que era pra criar galinha.
— Como a gente era ruim.
— Mas era. Parecia.
— É que ela ficava demais na cama e os cabelos ficavam pior.
— Bem diferente. Perdiam a cor.
— A coitada nem se animava.
— Também, praia no inverno!
— Não era. Era abril.
— Então!
— Era bicarbonato que precisava, né?
— Um pouco mais de carinho, também, né?
— Não comece.
— ...
— ...
— Você sente saudade?
— Sinto.
— Sonha com ela?
— Nunca sonhei.
Espirro.
— Gripe?
— Peguei...
— A mãe pensava em morrer na casa da praia.
— Que lugar!
— Aberto, deserto, sem boi, galinha, nada.
— Já viu na praia um pedacinho de terra, um pomar?
— Nada. Só a mãe mesmo.
— Olhando, admirada, olhando pro mar...
— Os cabelos de galinha...
— Lembra que se escondia no porão?
— E eu levantava e dizia: “Pai, veja se é a mãe. Veja se não é ela andando de novo dormindo.”
— E o pai?
— Ele é que não via!
— Não?
— Não.
— E daí?
— Ele só se queixava das pernas, que não podia descer.
— Mas na praia era diferente.
— Hum-hum. Ficava mais amigo.
— Melhor de coração.
— Ele dizia “é o mar!”
— Lembra que botou assim no peito a mão da mãe e disse, “Esperem. Depois eu converso.”
— Tinha de acabar o mundo naquela hora.
— Hã-hãm.
— Você quer mais um licor?
— Acho que não.
pr
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