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terça-feira, março 30

Seresteiro da Lua

Nos seus últimos tempos, a canção preferida de minha mãe era Lembranças, do Porca Véia. Minha mãe, antes de dormir, colocava um rádio de pilha ao lado dos travesseiros e ficava ouvindo música. Acompanhava a Rádio Aparados meio indiferente, só fazia observação quando tocava o Porca Veia, que era muito solicitado lá por Bom Jesus.
“Quando as almas perdidas se encontram/ Machucadas pelo desprazer/ Um aceno um riso apenas/ Da vontade da gente viver”
Minha mãe dizia: que música linda!
A Dona Carmem sempre gostou de rádio, em casa sempre havia algum sintonizado. Ela era de cantarolar acompanhando. Num tempo mais remoto, eu ainda na infância, lembro que a canção que ela mais gostava era Seresteiro da Lua, com Pedro Bento e Zé da Estrada. Minha mãe, no seu analfabetismo de letras (porque sabia fazer até conta de juros melhor do que eu) trazia aquela velha canção decorada.
Agora, por este genial meio de nossos dias, o Youtube, encontrei a Seresteiro da Lua, que há muitos anos não ouvia. Foi um reencontro forte. Revivi a voz de minha mãe no coro que fazem para o Pedro Bento e o Zé da Estrada as irmãs Galvão.
Ah-hã! Descobri finalmente de onde minha mãe imitava aquela afinação de voz ao cantar estes versos.
“Abre a janela querida/ Venha ver o luar cor de prata/ Venha ouvir o som deste meu pinho/ Na canção de uma serenata.
Sei que dorme sonhando com outro/ Desprezando quem é teu amor/ Que tu amas, de ti nem se lembra/ Quem te quer você não dá valor”.
Minha mãe imitava as irmãs Galvão. Este é o assunto e porque é o começo de abril. Abril é o mês de minha mãe, mês de seu aniversário. E, já está planejado, vou escutar o Seresteiro da Lua. Será a homenagem no seu dia e acho que outros filhos façam disso por aí.
Penso na simplicidade do bom-gosto da minha mãe. Não deixa de ser engraçado. Justo depois do seu aniversário vou lançar um livro que fecha um ciclo de minha vida: da literatura de investigação narrativa, da literatura de invenção, felizmente atormentada pelas influências do James Joyce.
***
O lançamento de O tal Eros Só será no dia 15 de abril, no Zarabatana Café.

Crônica no Pioneiro de amanhã.

quarta-feira, março 24

Penico quadrado

Eu gostava dos quadros de Iberê Camargo e um “bico” na Vejinha Porto Alegre me fez conhecer o pintor. Era para escrever um perfil sobre a sua trajetória e a Abril fechou a sucursal bem quando eu fazia as entrevistas. Nessa época, estava para publicar a minha segunda tentativa em literatura, que era Vitrola dos Ausentes. Numa manhã, criei coragem e pedi a imagem de um de seus quadros para a capa do livro.
Para “convencer” Iberê a ceder a ilustração levei o Glaucha, que era a única coisa que tinha, e era “experimental”. Uma semana depois, ele não me poupou: “não sei por que ao invés de dizer faca, você diz colher”.
Ih, pensei, achou o livro “penico quadrado”, que era a forma de Iberê ironizar a arte moderna, mais ligada às instalações então muito em alta. Ele achou que é “penico quadrado” e não vai ceder qualquer imagem.
Nunca disse se gostou ou não. E também leu o Vitrola no original e acabou autorizando uma de suas telas para a capa.
Tempos depois, apareceu num jornal de literatura de Curitiba, Nicolau, um texto de Iberê que é uma crítica ao vazio da comunicação em nosso tempo. Vejam:
Anui, Rabota.
Anui, Viragato – respondendo o cumprimento de Rabota.
Ambos param à beira da calçada, em frente da Livraria do Globo, melhor, de seu antigo prédio.
Teri mure viroto copata?
Sorô, sorô, fatulim rebentim.
Bentum, bentum, Viragato.
Rabota apoia-se no guarda-chuva e com voz de flauta, quase assobiando, piu, piu, sissifô, fu, fu, fu, prossegue agora quase assoprando.
Viragato desvia o olhar de seu interlocutor e se distrai na contemplação de uma pequena aranha que desce de um fio, como acrobata de circo, da arcada da porta da livraria. Depois, concentrando-se, prossegue:
Rabota, Rabota, renoê, rebinô, suravaca, sunurico, rebutoco, chocaraco!
Ti, ti sfrigo!
Pregunça! Putotanca! – Os dois filólogos conceituais se encaram, olho no olho, e se separam visivelmente irritados.
***
Iberê, apesar de toda a explosão criativa de suas telas, era um nostálgico. Um nostálgico do discurso linear, das ideias bem postas, redondas. Mas, como era generoso, foi capaz de ceder uma de suas telas para a capa de um “penico quadrado”.
Crônica no Pioneiro de hoje.


quarta-feira, março 17

Notícias do diploma

Neste sábado, a Universidade de Caxias do Sul entregará diplomas de Jornalista para os formandos do segundo semestre de 2009. Como se sabe, por decisão do Mi­nistro do Su­premo Tri­bunal Fe­deral, Gilmar Mendes, o diploma não é mais obrigatório para a profissão desde o ano passado.
Participarei da formatura e estarei também feliz com a conquista dos novos jornalistas. No entanto, diante de tal quadro, acredito ser mais do que oportuno lembrar como anda o processo de reconquista do nosso diploma cassado.
O deputado Paulo Pimenta (PT-RS) apresentou na Câmara uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que restabelece a obrigatoriedade do diploma para o exercício da profissão de jornalista.
Há menos de um mês, o presidente da Câmara, Michel Temer, criou a Comissão Especial que analisará a PEC. A comissão será composta por parlamentares indicados pelos líderes do governo, da oposição e de partidos e blocos.
Agora, é preciso que a Comissão seja instalada, o que só acontecerá depois das indicações dos representantes de cada partido. E estas indicações terão de ocorrer em breve, para que se possa ter a votação da PEC até maio. Do contrário, como estamos em ano eleitoral, dificilmente acontecerá a retomada do diploma ainda em 2010.
Caso não haja indicação dos membros da Comissão pelos líderes partidários, ela ficará parada. É preciso que os lideres de cada Estado indiquem logo os nomes que irão compor a Comissão.
Por isso, sugiro aos interessados, alunos, professores, jornalistas formados, que encaminhem um e-mail aos líderes gaúchos, e que eles agilizem a composição da Comissão. E que a PEC seja então encaminhada para votação em plenário.
Não sendo votado neste semestre, temo que o diploma caia no esquecimento.
***
Peço que relevem o tom desta “crônica” de hoje. Já sei, dirão, o Paulo está sendo corporativista. Sem dúvida, estou. E como não ser? Se eu não fizer um mínimo gesto em relação às coisas em que acredito (sou professor de Jornalismo), largo tudo de mão e vou plantar batata em Bom Jesus.

Crônica no Pioneiro de hoje.

quarta-feira, março 10

O hino de Leonardo

O cantor regionalista Leonardo, que faleceu neste final de semana, tem um vínculo muito forte com Bom Jesus. Sem ser filho da terra, ele é o autor do Hino de Bom Jesus, fruto de sua amizade com Os Serranos, que acabou se estendendo numa ligação afetiva com a cidade, suas fazendas e paisagem.
No começo dos anos 80, no auge da Califórnia da Canção, acompanhado de Os Serranos, Leonardo ganhou a calhandra de Uruguaiana com a já clássica Tertúlia (1982). Na mesma época, estiveram juntos em Viva a bombacha!
Daquele período é também o ACORDE (Acampamento dos Conjuntos Regionalistas do Estado), promovido pelos Serranos, que acontecia em Bom Jesus. Leonardo era figura frequente e, ele que já havia acertado naquele que para alguns é o hino não-oficial do Rio Grande do Sul ( Céu, Sol, Sul, Terra e Cor ), acabou fazendo também uma homenagem a Bom Jesus. E criou a letra e a música de “Bom Jesus, minha cidade”, que se transformou no hino oficial em 1989.
Por isso, na abertura de eventos de Bom Jesus, não se escuta andamentos épicos, movimentos orquestradas em tom aligeirado, e sim uma canção suave, um poema de amor à terra que é esta criação de Leonardo.
O céu está mais pertinho/ Deus está em toda parte/ O povo tem mais carinho/ Os artistas têm mais arte...
Quando a chuva cai mansinha/ Molhando minha cidade/ São os seus filhos ausentes/ Que estão chorando saudades/
São os seus filhos ausentes/ Que estão chorando saudades
.”
Mais uma saudade para Bom Jesus. E ainda seus filhos valorizando a arte.
Sim, justamente agora também sei a notícia que a professora Lucila Sgarbi Santos, que há muito tempo se dedica à pesquisa e conservação da memória de Bom Jesus, receberá em 17 de março a Medalha Ana Terra. É uma homenagem do governo do Estado para as mulheres que contribuem com a cultura do Rio Grande.
Há anos, Lucila tem como uma “missão de vida” promover, com todas as dificuldades, os seminários que preservam e valorizam a tradição dos tropeiros, que já impulsionaram a nossa economia em outros tempos.
Lucila merece.
Crônica no Pioneiro.

quarta-feira, março 3

8 ½

Otto e mezzo é aquele filme autobiográfico do Federico Fellini muito inspirado, dos seus mais criativos. A ironia é que Fellini estava vazio, sem ideias, e sendo pressionado para uma nova produção. Ele parte então, mais ou menos como Orson Welles no Cidadão Kane, fazer o filme sem um plano definido. E isto depois de já ter dirigido oito filmes e meio, daí o título.
E então se põe na pele de um cineasta, Guido Anselmi (alter ego de Fellini e interpretado por Marcello Mastroianni), e passa a fazer da imaginação a forma de sobrepor a crise artística e existencial que o atormenta (pois está também em crise o seu casamento). O resultado é uma junção de passado, sonhos e presente, numa profusão de flashbacks que só se salva pelo olhar muito apurado de Fellini pelo que há de humano.
É memorável a cena final com um desfile circense de todas as pessoas que passaram pela sua vida, com aquela canção do Nino Rota de fundo. É um dos grandes momentos do velho e melhor cinema.
O que Fellini fez em 8 ½, no fundo, é a equação não só para ajudar criadores em crise (que “trem” é este que não traz o trem? Falo, claro, da falta de imaginação do corso da Festa da Uva que perdeu o tema que estava aí picando), como é a fórmula para todo autor. O que se faz em literatura (o campo puro da imaginação, embora Fellini tenha sido autobiográfico) se não isso?
1) pegar pessoas e cenários que não se conhece (são personagens) e os transportar para o passado (em alguma literatura este passado pode ser um dia, uma hora);
2) idealizar um mundo que não é real, por isso, o sonho;
3) representar o presente pelas convicções e ideias que movem o autor, porque é inevitável a interferência do criador por mais distanciado que queira estar da sua obra.
Como se vê: passado, sonho e presente. Esta é a equação que se põe no liquidificador (a literatura de invenção, ou o filme que exige do espectador como Otto e Mezzo), ou então se organiza (a literatura linear), mas que é a fórmula da literatura de forma geral. Mesmo as biografias seguem este caminho.
Mas, como sempre, o problema é aquele: é preciso uma boa história e um bom manejo da mesma. Muitas vezes, até se tem uma boa história para contar, mas o manejo falha. Quer dizer, não “acontece” o certo talento que em Fellini sobrava.
Em arte, passar do ²/8 ao 8 ½ é o ponto crucial.

Crônica de hoje no Pioneiro.