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terça-feira, outubro 28

Fogueira de livros

Eu sei que amadurecemos a nossa democracia, que eleições servem mesmo pra isso, mas só consegui ter algum entusiasmo com o jingle do Gabeira no Rio. A campanha do Gabeira, sem dinheiro, foi a mais criativa que vi. O jingle que embalou suas propostas entra para a lista dos melhores de nossa política. É uma balada-funk, com a participação de vários músicos, que começa com um jogo de palavras que diz tudo já.
“Sorrio, sorrio. Um sorriso inteiro/Sou Rio, Sou Rio. Rio de Janeiro”.
E entra um batidão contemporâneo com referência às coisas que caracterizam a maravilha que é mesmo a cidade: a paisagem, o povo, as praias. A nomenclatura de cada bairro. Isso, e algumas propostas do Gabeira (regulamentar a situação das prostitutas; rastrear o mosquito da dengue através de um plano aéreo e programas de computador), me entusiasmaram. E foi só. No mais, a mesma política paternalista e coligações estapafúrdias até em São José.
Sim. Esta crônica é mais um petardo nos políticos (a segunda vez que toco no assunto), porque há tempo que reclamo que acertem uma conta aí. Como é que passou na Câmara, no Senado, e foi assinada pelo Lula esta aberração que é a Reforma do Português???
Olho aqui em volta. Devo ter muito mais de mil livros, documentos que a partir de janeiro estarão desatualizados. Estarão fora das normas, imprestáveis, um investimento de quase uma vida que servirá pra quê?
E meu projeto no Fundoprocultura? Recém fez um ano, publiquei um livro que distribuí na quase totalidade aos colégios? Nada mais valem. Nenhuma criança, claro, deverá fazer uso de um texto cheio de “problemas” gramaticais.
Inventaram uma reforma que nos fará escrever “linguiça” e assembléia sem acento. Querem “unificar” a nossa língua, só que aqui dizemos camiseta para as camisolas de Portugal.
Será que tal absurdo não tem volta??? Não haveria forma de brecar tamanha bobagem?
Olha, bem ou mal, eu escrevo, sou professor de redação no Jornalismo e mais estas crônicas semanais. Alguém me consultou? Quem nos perguntou se queríamos sujeitar o nosso idioma à inutilidade desta alteração?
Os ingleses ainda escrevem como Shakespeare escrevia em seu tempo. Nós? Pensamos numa fogueira de livros.
(Texto para o jornal Pioneiro de quarta-feira.)

sábado, outubro 25

Marcenaria do Bonja

Beleco chega na marcenaria. Diz ao sócio.
— Tão prevendo chuva aí.
— Quem disse?
— O rádio, ué.
— O rádio fala, mas não bebe. Não confie.
— Mas vai chover mesmo.
— Então, ótimo, assim economizamos.
— Mas, como?
— Pegue uns baldes.
— E o quê?
— Junta a água nos baldes e passamos o mês.
— Ah, mas é água de chuva.
— E água vem de onde, Beleco?
— Ora, eu sei!
— Então?
— ...
— E pegue também umas duas caixas, aí. Inteiras.
— Pra quê?
— Aproveita e prende a luz.
— A luz do dia?
— Não estão falando em recessão, em crise?
— É...
— Economizamos também a luz.
— Olha aí que você derrubou!
— Foi só um prego.
— Junte, ué.
— Beleco, não é tão simples assim. Já te pedi pra pegar o balde.

(Ps! Para melhor compreender o perfil de nossos dois protagonistas, leiam abaixo um outro episódio da Marcenaria).

Marcenaria do Bonja II

— Alô. É da marcenaria?
— Quer jogar que acertou, minha senhora?
— Como assim?
— Quer jogar que é da marcenaria?
— Ãh... Não, eu não quero jogar. Eu só quero um armário.
— Pra mulher ou pra homem?
— Não entendi...
— Pra mulher ou pra homem o armário que a senhora quer?
— Ora, armário é armário. Serve pra homem, pra mulher, até pro padre...
— Quer jogar que não serve?
— Não serve?
— Não serve. Quer jogar?
— Não, não quero jogar. Eu quero apenas um armário. Seja pra homem, mulher, a rainha da Inglaterra. Eu quero um ar-má-ri-o!
— E pode pagar?
— Como assim? Claro que posso, não estaria ligando se não pudesse?
— Quer jogar como não pode?
— Meu senhor... Como é mesmo o seu nome?
— Beleco.
— Olha Seu Beleco, o senhor me diz o orçamento...
— Quer jogar que não dá?
— Ora, quer jogar, quer jogar! Quer jogar que o senhor é louco?
— Essa eu não jogo.
Barulho na porta. Entra o sócio:
— Alguém ligou, quem era?
— Uma doida que queria um armário e não sabia pra quem. Tava indecisa, coitadinha.
— Essa é boa. E você deu o orçamento, Beleco?
— Eu não. Como ela não sabia pra quem era o armário, eu também não sabia que preço cobrar.
— É isso aí. A gente nunca deve ser superior aos clientes.

segunda-feira, outubro 20

A descoberta da inibidora

Garotas peladas fumando maconha. Este é o título de uma publicação de uma editora alemã agora na feira do livro de Frankfurt. Adepta da “propaganda incisiva”, a editora, como se vê, apela, num flagrante desespero para dar ao impresso uma sobrevida. Diga-se, parece ser uma edição “ilustrada”, e eu não descobri muito mais sobre o seu “conteúdo”.
O fato é que na mesma feira se encontra a razão para a estratégia sensacionalista. Uma engenhoca chamada e-readers (avanço ao já existente livro eletrônico, porque dispensa o saco da caneta leitora que “interpretava” as letras) é a grande atração do evento.
Paulo Coelho, também por lá, se rendeu à força dos livros oferecidos para leitura eletrônica, e fez o elogio das novas técnicas. O cara, que é astuto, sabe mesmo que o caminho é este. Perdida a batalha, se alie ao inimigo.
Pena, mas as “garotas peladas fumando maconha” pouco conseguirão agora que ficou mais visível a suposta “morte” do livro tradicional. O livro tradicional está é muito vivo. O que morreu, na verdade, foi a afluência de novos leitores.
É bem óbvio: as duas ou três horas que destinávamos para a leitura de revistas, jornais e livros, foram deslocadas para a oferta eletrônica. As novas gerações migraram, com o seu tempo disponível, principalmente para a internet e os seus apelos.
Todos continuam lendo. Talvez, lendo mais do que nunca. Só que estão todos navegando, indiscutível constatação em cada aula que entro.
Mas, dos males o menor. Porque o mal maior é o que internet tem feito aos autores. Marcelino Freire já havia se queixado e o Mario Bortolotto agora também entrega os pontos: as centenas de portas em oferta no espaço da internet são as maiores inibidoras da criação.
Você que é pesquisador, escritor, qualquer outra área com intenção criativa, sabe do que estou falando: entra na internet e tem todos os jornais. E tem ainda a leitura de seus e-mails, em suas duas ou três contas. E mais a comunidade para ser conferida. E mais o orkut. E mais o blog a ser abastecido. E mais o blog dos amigos. E mais a wikipédia e Youtube. E mais os sites de fofocas. E mais o treino do Grêmio ao vivo. Nada pode ser pior.
Quando se dá conta, está lendo notícia da mulher fruta e outras tais. E lá se foram as tuas três horas. Talvez, por isso, as poucas novidades. Romances perdidos, irrecuperáveis.

terça-feira, outubro 14

O ipê de Eduíno

Assim como os nossos dias podem ser contados por episódios que não viraram notícia, também os livros de história podem trazer o melhor em suas notas de rodapé. Estive relendo a obra Município de Bom Jesus, de nosso historiador Arthur Ferreira Filho, e percebi as preciosidades que traz em seus pés de páginas.
O livro é de 1964 e, vejam só, logo de saída, a nota de rodapé na página 9:
“No momento em que escrevemos este trabalho, a devastação dos pinheiros é arrasadora e nulo seu replantio.”
Só isso! E diz tudo. É a nossa síntese. Ele diagnostica, em linha e meia, numa notinha de 1964, o que Bom Jesus estava promovendo como o seu futuro. A nota está no capítulo em que Arthur Ferreira trata da flora. Está dizendo que, exceção do pinheiro (araucária brasiliana), a flora bonjesuense não é das mais ricas. Descreve algumas madeiras de lei (cambará, canela, cedro, guatambú e bugre), destacando especialmente uma delas: o ipê amarelo, segundo ele, “a mais bela árvore do Brasil”, que na primavera se recobre de pétalas cor de ouro.
Nova nota de rodapé e lá vem o Arthur acrescentando: os capões da fazenda Santa Cruz eram ricos em ipê amarelo.
Ora (e agora a nota é minha), esta fazenda se notabilizou por ser a origem de um dos clubes de Bom Jesus, o Santa Cruz, que saiu de lá como time para rivalizar com o Juventude. Mais: pertencia a Hortêncio Dutra, irmão de João Dutra, um dos maiores botânicos brasileiros, e que doou sua biblioteca para a construção do hospital do Bonja.
Mais uma nota minha: consta que João e Hortêncio seriam descendentes de holandeses. Isso demonstra que, além dos índios nativos, lusitanos, alemães e italianos, tivemos outras etnias em nosso povoamento.
Arthur Ferreira segue em seu livro com outras preciosidades nas linhas de baixo: que o nome Rio do Inferno veio de Passo do Inferno, no Rio Pelotas. E nos informa que, comparado com outras regiões, foi mínimo o contingente de escravos nas fazendas de Bom Jesus.
Mas, os ipês nas terras do João botânico é que me chamaram mesmo a atenção. Coincide com uma destas cenas que não viram notícia, e que aconteceu no meu Bonja, agora, no dia 16 de Julho, data dos 95 anos do município. Nosso botânico amador (no sentido de amor às plantas) Eduíno Fernandes, alheio a todos, se dirigiu à praça Rio Branco e plantou uma muda de ipê amarelo. Foi uma demonstração silenciosa para valorizar a natureza e a vida. Seu Eduino fará 96 anos em novembro.
Nota: Acima, pinus, um deserto na sombra que tomou Bom Jesus depois das araucárias.
(Texto para o Pioneiro de quarta-feira.)

terça-feira, outubro 7

O mago incrédulo

Participei na feira do livro de uma mesa com Fernando Morais sobre a biografia do Paulo Coelho. O Fernando acabou de escrever a melhor obra do Paulo Coelho. Porque a melhor obra do Paulo Coelho é a sua própria vida. Incrível que ainda esteja por aí, tantos foram os episódios que se envolveu no obsessivo projeto de ser um grande escritor.
Há mesmo uma série de tragédias na vida de Paulo Coelho que beiram o inacreditável e, Fernando Morais, um incrédulo, um materialista (não esqueçamos que são dele A Ilha, de Fidel, e Olga, do Prestes) se aproxima do bruxo munido deste arsenal ideológico. Além da mesa, tive o privilégio de outras conversas com Fernando, e nestas paralelas ele só reforçou a impressão que tive da leitura de O Mago. Li a biografia de 600 páginas em duas pegadas, e nem sou nada fã do Paulo Coelho. A vida do cara, que foi parceiro de Raul Seixas (aliás, uma pálida figura diante de tantas outras mais fortes) dava mesmo livro.
Paulo Coelho foi ator, hippie, quando se era hippie. Só que este espírito traz ainda hoje, misturado com um aguçado senso capitalista, fruto de sua origem classe-média carioca, num Rio que lhe ofereceu tudo à perdição: drogas, artes, belas mulheres.
E Paulo Coelho se deu mal nesse universo: o pai o achava irrecuperável, louco, e lhe impõe três internações numa clínica para a “cura” com eletrochoques. E Paulo Coelho passou ainda por torturas no DOI-CODI da ditadura.
Até encontrar Cristina e um certo Jean que mudariam sua vida. Cristina é a mulher com quem vive ainda hoje. Jean é o líder de uma seita (do bem, já que antes Paulo Coelho assegura ter tido encontros até com o demônio, como está numa cena de banheiro no texto do Fernando). A seita é uma tal RAM (cristã) e Paulo Coelho teve a aparição deste Jean (carne e osso) num campo de concentração na Alemanha. Esta epifania, digamos, seria seguida de 8 missões, ordálias, como dizem os místicos, mudariam a vida de Paulo, que por fim alcança seu sonho: ser um grande escritor, reconhecido e vendido.
Hoje, já vendeu mais de 100 milhões de livros e é mais traduzido do que Shakespeare. E deve muito à Cristina. Na virada de vida, início dos anos 80, criam um editora. Chamava-se Shogun e promovia concursos para garimpar novos escritores. Lembrei, lendo a biografia, que tenho um dos volumes da Shogun. Descobri que sou um daqueles. Meus primeiros editores foram Cristina Oiticica e Paulo Coelho.
Contei isso para o Fernando Morais que me ouviu espantado. O incrédulo Fernando anda mais atento às coincidências. Depois do Paulo Coelho anda um pouco místico.

(Crônica de amanhã no jornal Pioneiro.)