OBRA     AUTOR
         


Vitrola dos Ausentes
Clique aqui e leia um trecho.


Nova Edição



Clique aqui e leia.


DEMAIS LIVROS


Glaucha
Clique aqui e leia um trecho.



Iberê
Clique aqui e leia um trecho.




Valsa dos Aparados
Clique aqui e leia um trecho.




Missa para Kardec
Clique aqui e leia um trecho.



Quando cai a neve no Brasil
Clique aqui e leia um trecho.


Cozinha Gorda
Clique aqui e leia um trecho.


As luas que fisgam o peixe
Clique aqui e leia um trecho.

Coletâneas


Meia encarnada, dura de sangue
Clique aqui e leia um trecho.



Cem Menores Contos

Clique aqui e leia um trecho.



Contos Cruéis

Clique aqui e leia um trecho.



Contos do Novo Milênio

Clique aqui e leia um trecho.




 

terça-feira, outubro 31

Banca do Fischer

A crônica Meu amigo David foi postada pelo meu outro camarada, o Luís Augusto Fischer, no seu blogue Banca do Fischer, www.clicrbs.com.br.
O Fischer está escrevendo uma novela que se passa na Feira do Livro de Porto Alegre e postando direto na Banca.
Entra lá pra ver!

A margem da cera

o tornear do corpo
do cume do ombro
à margem da cera

apaguei
pr

Haikai

A sombra do almoço
desenha nas pedras

o faro do sol
pr

segunda-feira, outubro 30

Haikai 2

Trevo de canto
a cigarra formiga

festa
pr

Meu amigo David

Eu senti a sua falta no sábado, porque ele sempre aparecia, tinha todos os meus livros, e nas sessões de autógrafos chegava com a sacolinha cheia de recortes “com o que saiu”.
Meu querido amigo David Camargo não apareceu na feira sábado à tarde porque já estava morto. Faleceu sábado de manhã.
Quando soube, pensei: não deixou de ser uma homenagem ao meu amigo estar ali na feira no dia de sua morte.
Era muito querido em seu meio, deve ter feito uns 50 filmes e nem falava em cobrar. Estava com 73 anos.
Conheci David em 1982, na Mostra de Artes de Bom Jesus. Já apresentava o seu “monólogo”, e nunca mais deixou de falar do Bonja. Fez amigos. A centésima apresentação do monólogo foi lá.
Daí, nunca mais deixou de aparecer a cada lançamento.
Eu dizia que era o cara mais injustiçado da cena teatral gaúcha. Achava sua expressão facial de gênio (vejam a foto acima).
David vinha de longe. Tinha participado do Coração de Luto, com o Teixeirinha, na década de 60. E o convidamos, a nossa turma de cinema da PUC, para ser a estrela do curta-metragem de conclusão do curso. Chamava-se Ogramac divaD, um palimpsesto que eu mesmo criei em homenagem à figura, para valorizar a sua interpretação.
No filme, ele faz vários personagens da literatura mundial. Faz Arlequim, Pierrot, Shakespeare, se veste de mendigo, interpreta São Sebastião. Mas, o melhor, é o David dançando balett, frevo, samba, o escambau.
Perdemos a fita, uma pena. Ficamos mais tarde de dublar, nunca mais fizemos, e o curta deve estar perdido nos arquivos da Famecos.
David sempre me cobrou isso aí.
Foi nosso convidado de formatura, depois. Lembro ele dizendo palavrões na festa que fizemos na casa do Sérgio Kapustan.
Quando resolvi ir embora pra Franca, na despedida, no Zelig, apareceu o David por lá. E me deu esta foto aí de cima que eu sempre guardei com carinho. Vejam só que figuraça!
No verso está escrito:
"Ao amigo Paulo Ribeiro uma recordação sincera e que nunca será esquecida do amigo das lutas artísticas".
Não foi esquecida, amigo David!

domingo, outubro 29

Estar no caminho

Estar no caminho é topar um olhar perdido e guardar para si

é gesto a decifrar
honra toda ao poeta ao que não for ficção
é responder ao imprevisto
à falta de Ana, Roberta,
à moça da tevê

é dar resposta, ter brilho,
ser ingênuo, imaturo,
segurar por instinto se o carro avançar

e há mulheres que surgem assim...

quinta-feira, outubro 26

Haikai

A boca de costas pro céu
o céu da boca toca
sino
pr

Haikai 2

Notas nos dedos
rasgadas, somam
a música

pr

Palavrão

Eu já fui bom motivo
Eu já fui, breve,
o maior amor de uma vida

Hoje sou
— sorrindo por dentro, eu sei—
nem palavrão sou,
se me lembras

pr

Feira de Porto Alegre

Neste sábado, 17h30min, na Praça de Autógrafos, lançamento do meu Cozinha.
Espero os amigos por lá.

terça-feira, outubro 24

Através das venezianas

através das venezianas
há uma cor de bandeira do Rotary
o que parece um parto
há um batismo negado

através das venezianas
um fio escapa
mal desenha a criança, os seus lábios

como a dor de uma mão que batia
há a textura do quarto
esse gesto da mulher se lavando

através das venezianas a luz e o seu malabarismo

pr

Drible

correr às catas de um bicho solto
tentar botar a mão no que se fala dormindo
pr

O vestido simples

Como um vestido lembra
úmidos e tão próximos
teus lábios

teus lábios!

pr

segunda-feira, outubro 23

Não escrever

Não escrever é não assoprar a vela
dar vida à chama
é abandonar a memória
o seio da amada
é condenar-se sem pedido ou direitos

É não poder dizer do azul
do que se pensa da dor
é um parto sem luz,
é, portanto, calar a vida

Deixar de escrever é a hora de uma despedida que se perde

Se não se escreve,
onde a morte?
onde a sinceridade de uma água servida?

Resta o nada,
a névoa em que se solidifica o fraco

O pé da Igualdade está no que se escreve

Diversão, blasfemar,
escrever é esparramar o feijão escolhido

É um mar, seguramente

Não escrever, por oposto, é o vazio
o vazio de um corpo sem alma

um circo triste
um circo aos pedaços que o vento não sopra

pr

sexta-feira, outubro 20

Papo sobre o blog

Amanhã, às 17h, na Feira do Livro, estarei num papo sobre Blogs de jornalistas-escritores com o Carpinejar. No Café Cultural.
Apareçam!

quinta-feira, outubro 19

A polidez da dispensa

nenhum grito
troco
bronca
a merda de um gesto

este meu triste desfile à polidez do dispensar
pr

Da vida dos rios

água turva em peixe ralo
tanto volta até que filtra
pr

quarta-feira, outubro 18

Os recordistas da feira

Os jornalistas e o seu O livro da feira, recordista de autógrafos

Mesmo com chuva e frio em Caxias, 257 exemplares foram autografados. Superaram o recorde de Felipão, com Ruy Carlos Ostermann (240 livros sobre o penta no Japão). Tá certo, o livro foi distribuído de graça, mas ainda assim é uma marca

A turma dos jornalistas, ex-alunos da UCS onde desenvolvemos o projeto do livro: Juliano, Aline Zanotto, Roberta, Carina, Aline Fatori e Everton. E o professor, por ali, muito orgulhoso

terça-feira, outubro 17

Há um homem calado

A bíblia é a mais vendida na lista dos mais vendidos e eu nada tenho com isso que o jornal me informa.

Vejo os jacarandás durante o café e ainda só vejo.

Mas a moça da bicicleta passou mais cedo...

e agora já penso.
pr

Prisão de vento

Prisão de vento é o cabelo quando se cuida
pr

segunda-feira, outubro 16

Dar atenção

Dar atenção à bundinha, ter criança.
Dar atenção à planta, regador a mijar.
Dar atenção, ter cuidados, quando se estanca um sangrar.

Dar atenção a Deus, pede a missa.
Dar atenção à aparência é se orgulhar.
Dar atenção à sopa, ao porco, ao mundo, à crise que vive o hospital.
Dar atenção ao assalto, às manchetes, à garganta, à voz que pede atenção!

Dar atenção à viúva, perigo!
Dar atenção à bagagem, o terror!
Dar atenção aos sentimentos, carinho.
Dar atenção ao simples, um traço.
Dar atenção à barriga, gravidez.

Dar atenção ao triste, ter seu choro.
Dar atenção à figa, à intriga, à guerra nuclear.
Dar atenção à agulha, ao palheiro, chimarrão.
Dar atenção ao moderno, ao batido, ao inchume da coração.

Dar atenção à dança, brinquedo dos passos.
Dar atenção ao alpiste, passarinho a contar.
Dar atenção ao túmulo, passatempo.
Dar atenção ao deboche, se humilhar.

Dar atenção aos separados. Quem não é, pode ser.
pr

domingo, outubro 15

Muito bom!

Quando a minha vizinha chegou, a doce D. Isabel, do nono andar, ela me salvou a pátria. 80 anos, cansadinha, chegou, pediu cadeira, largou duas de 10 na mesa e lascou:
Como é, esse autógrafo não sai?!
Hehehehe!
Ela descontraiu o ambiente e depois foi tudo certo, sim.
Á minha frente os amigos, leitores, sei lá como vieram bater ali.
E eu sem “bilhetinho”, como lembrar o nome de todos?
Branca.
Maria Clara.
Carmem por ali passou!
E a garota com a camiseta, espaço em branco, eu que escrevesse ali...
Na fila se ganhava Libertadores, eu ouvia, filhos levavam os pais gremistas ao Beira-Rio!!
Alunos, colegas, gente que não se via mais.
Tanta gente que, bah!, derramaram a água.
“Não se encabule. Vamos fingir que foi o autor!”
Do autor perdoam tudo, até se o seu livro não prestar.
É assim sessão de autógrafos na praça.
Acontece cada uma, mas é fácil de fazer.
Você chama os amigos e diz:
Me dêem a mão. Me ajudem a assinar aqui!

Foi muito bom e obrigado a todos que foram!

Hoje, o livro dos alunos

Hoje, o livro dos alunos da UCS chega à feira. Contando exatamente a trajetória deste evento cultural de Caxias do Sul, os agora jornalistas farão a distribuição gratuita da obra durante toda a tarde. Sessão de autógrafos às 18h.

Os pés no molho

Mariinha, Mariinha, Mariinha é quando se diz três vezes a mãezinha de Jesus.
E ela dizia mesmo, Meu Pai, ou creio em padre!, quando encontrava arte de criança espalhada pelo terreiro.
A Aceitada jurava que não foi ela, mas era só cabeça de Pateta arrancada, era só uns chumaços úmidos com pele, umas gretas de carne de pé do filho em fio desencapado voando no vento.
Mas que pouca vergonha aquela falta de higiene!
E a Mariinha dizia, Pedro Antônio, olhe isso! Pedro Antônio carregue o penico. Pedro Antônio bote os pés no molho. Pedro Antônio, esfregue, esfregue, que teu pai não pode.
Trecho de Cozinha Gorda, p. 72

sábado, outubro 14

Grande amor, pequenas causas

Grande amor
tão grande em préstimos
acabar
no que não se deve

pr

sexta-feira, outubro 13

Logo mais, às 18h

Iguaria de Letras - Pioneiro

Cozinha Gorda é um típico Paulo Ribeiro. A narrativa embola o simples, faz piruetas como vapor de chaleira fervente, conta histórias de gente com demências, defeitos, desejos, esperanças, igual a todo mundo...
Pedro Antônio é o condutor da história, narrador encerrado numa jaulinha sob a mesa da cozinha a observar o mundo que lhe é permitido vislumbrar. É lírico, alegre, triste e doente, tudo ao mesmo tempo, por isso muito bom...
Gilberto Blume, Jornal Pioneiro, de hoje, Caderno Feira do Livro

Autógrafos na Feira - Zero Hora

José Clemente Pozenato e Paulo Ribeiro, escritores gaúchos consagrados, lançam seus novos livros hoje e amanhã na 22ª Feira do Livro de Caxias do Sul, na Praça Dante Alighieri. As duas obras são publicações da Editora Maneco, de Caxias.
Cozinha Gorda, de Paulo Ribeiro, tem sessão de autógrafos hoje, às 18h.
- É o meu livro de maturidade - diz Ribeiro.
A narrativa da novela é conduzida no ponto de vista de Pedro Antônio, um menino que vê sua mãe se atarefando na cozinha. Essa cozinha é o centro de uma residência que vai abrigar uma paulatina desintegração familiar.
Cozinha Gorda é o sétimo livro do autor de Vitrola dos Ausentes (1993). Trechos da novela, que tem apresentação do poeta Fabrício Carpinejar e é ilustrada pelo próprio Ribeiro, podem ser lidos no blog do autor.
Zero Hora, Segundo Caderno, de hoje, p. 7

quinta-feira, outubro 12

Figuras do Bonja

Rachid, operador de som
Lalé, ex-bancário

Lambreta, taxista

quarta-feira, outubro 11

A cozinha — por Fabrício Carpinejar

A Cozinha Gorda é uma esperança, porque renova o trajeto do autor. É possível dizer que é ainda melhor do que Vitrola dos Ausentes, mas seria um golpe baixo, desonesto. É um livro que o completa.
A falta de lugar é o ponto de vista de um menino que vê sua mãe se movimentar na cozinha. A cozinha é uma sala de estar mais do que a sala de estar. Paulo Ribeiro faz uma justiça com um pedaço vivo da residência, sempre deixada de lado nas histórias gaúchas.
Há uma naturalidade que cativa em cada parágrafo, o olhar vem sempre de baixo, de viés, como se o guri descrevesse o mundo do chão de uma mesa.
Não há um olhar de frente. O olhar é para os ouvidos. Papo de ouvidos para ouvidos.
Paulo parte da tese de que na cozinha não se mente. No quarto, na varanda, no pátio, a mentira até pode passar despercebida. Na cozinha não, lugar do tira-gosto, da proximidade leal entre o estômago e o coração. A vida ali é discreta e não daria um livro.
É justamente o que não rende livro que atrai.
Lançamento na sexta, às 18, na Feira do Livro.

O colo da amada

bêbado, bêbado,
o chão da saia
zelo, por teu colo,
tuas pernas sóbrias sobram
pr

segunda-feira, outubro 9

A orla que dá saudade

Você não sabe das sandálias
O que você sabe de saudade?
Você sabe de ex-amor?
Da mulher que põe logo o mais leve vestido num primeiro calor

Você sabe de uma mulher assim e sente saudade?
Acredito que possa saber
O que uma mulher deixa para lembrar que te lembra?
Sandálias, talvez isso
Um vestido de orla simples que faça por nós homens sozinhos!

Saudade!
Homens sós manjam disso
O que você sabe lembrar?
Eu sei de um rio onde ela se banhou ainda moça
Eu reconheço na solidão a sua boca triste distante que talvez murmure por mim

... e seu vestido
Lembre dele pra sempre quem me ler

pr

Convite

Nesta sexta-feira, 13, às 18h, lançamento de Cozinha Gorda na Feira do Livro de Caxias.
Apareçam!

domingo, outubro 8

A casa

A casa não é mais.
A casa não existe.
Mas há um suspiro fundo, um desconsolo forte por essa ausência insuperável.
Por que não se afasta daqui a tua presença?
Sentada, meiga, esse teu olhar de gatinha branca que se deixa acarinhar.

(A gravura acima saiu por conta de um quadro a óleo de minha mãe quando jovem)

O rio convidava a chuva pra dançar

O rio convidava a chuva pra dançar
Nunca dançaria
Porque a chuva achava de não chover no rio
Chovia noutro
E o rio, tristonho,
rio de música, porque o rio era só do poema,
dizia pra chuva, me leve

pr

sábado, outubro 7

O fabricante

O fabricante tinha feito um enxoval com a imitação de asa.
Com amor, tudo azul e carinho, o fabricante tinha feito um enxoval com a imitação de anjo.
E por causa do fabricante ficou uns cinco anos seguidos se engravidando.

pr

Corpo de moça

dobra
bonita
do mato
como a puma
essa força sem controle que o corpo de moça tem
pr

O amor quando desbota

O amor, até que se cure
se ajeite
despeite
renegue
não se permite ao desbotar
pr

quinta-feira, outubro 5

Calma

Calma para ser lembrada calma
Calma para o tudo automático

Calma como um amor que não se revela
pr

quarta-feira, outubro 4

Eu ainda sou leitor!

Quem pode, se sacode hoje na internet. Os demais, nunca puderam, e não é à toa que temos no Brasil 74% de analfabetos funcionais. Quer dizer, gente que só assina e soletra placas e que jamais teve nas mãos a fortuna de um livro.
É cristalino. Eu dou aula em Universidade. Raro se ver aluno com livros, como é coisa natural, por exemplo, no Japão ou em Beja, Portugal.
É triste constatar. Pode-se organizar um lançamento com atrações, telão, teatro, doces e salgados, vinho, poucos aparecem. Sempre aqueles que não se dão por vencidos, raros, já.
Não sei se estou errado. Percebo cada vez mais e, por isso, cresce de importância a feira que está chegando. Aliás, feira que avançou na disponibilidade de livros nesta evolução de 22 edições (houve mais 7 extra-oficias) desde 1984.
Hoje, nossa feira é a maior do interior e, dizem, mais autêntica do que a de Porto Alegre, que se foi em direção ao rio.
Torço, portanto, para que eu esteja errado, e que a feira que começa seja de muita presença, compra de livros e que as pessoas me parem ali na praça e digam. Eu ainda sou leitor!
Vão ter reconhecimento e o meu carinho.

(Trecho da crônica de hoje no Pioneiro.)
Na foto, frei Celso Bordignon, numa outra edição da feira, depois de receber o seu exemplar de Vitrola deste amigo

A cadela feia

A cadela de tão feia pede desculpa

parece que deixa uma lágrima
pr

terça-feira, outubro 3

Derrame

Não tenho dinheiro para um segundo mais
pr

segunda-feira, outubro 2

Como se acha tempo

Como se acha tempo pra não falar?

Como se acha tempo ao condenado
pro medo,
o tempo do estalo
Como se acha um tempo limpo
pro filho
pro rádio
pros dentes, pro sangue,
pra devolver o que é de Deus a Deus?

Como se acha tempo
aos poucos?
no tarde?
o tempo pra avançar?

Se acha com a lupa?

Como se acha o tempo que demorou
a chance atrasada
Um tempo pra chuva
Como se acha tempo pra se mudar de amor?

Como se acha?
tempo,
dias, semanas, anos
Como se acha,
quando vivos,
o tempo que já morreu?

pr

domingo, outubro 1

Bom Jesus não existe

Estive em Bom Jesus
continua simples
a rua varrida por um tornado já recuperou
a Pousada do Escadão pintaram de azul
a Teresa pasteleira me deu um abraço de saudade muito bom!
Bom Jesus não existe, mas continua lá

Mariinha

Na casa da Mariinha era um cheirinho de café de longe e o modo de preparo era ser amorosa como ela adorava fazer. Com muito amor, num assoprar bem doce e de ir aos poucos escaldando o coador.
Demorava um tempão fazendo cardápio e não vai justo ela ficar na situação dependente depois!
A Mariinha ficou de comer pelo nariz ovo inteiro e legumes cozidos, sem contar que lhe davam batata média e ainda feijão.
O cheiro do café torrado! O cheiro do café torrado!, gritava e o mundo inteiro atendia ao mimo.
E por isso era uma injustiça e um sofrimento o que lhe aconteceu. E umas e outras ficavam enciumadas. Mas pra Mariinha continuava tudo igual. Nem Marmelo, Pedro, Anselmo, cabelo de galinha, fazia que a Mariinha na vida saísse do que diz a bíblia.
Porque mãe não vê defeito, rotariana, jubilada, a Mariinha não queria que guardassem coisa ruim. Nem da família, do município e nem do mundo.
Porque vaidade pra ela não prestava e, quando se via apertada, inventava de agir assim: de dizer pra alguém que ela ia torrar café e ia torrar café e saía dali.

Trecho de Cozinha Gorda, que chamaram em Bom Jesus de "esperança"